Asia Circuit é a primeira sequela do anime Cardfight!! Vanguard. Uma franquia lançada no mundo televisivo logo após a chegada do seu TCG (Trading Card Game) ao mercado. Depois do trabalho satisfatório, em especial a promover o jogo de cartas, que a produção inicial apresentou, era expectável uma segunda temporada que, embora incapaz de proporcionar grandes voos, tivesse um nível semelhante à sua prequela, quer em termos de jogo, quer no que ao enredo diz respeito. No entanto, isso não aconteceu.
Uma história em retalhos
Assumindo que o leitor está a par do que aconteceu na primeira temporada do anime, caso contrário, não faria sentido o seu interesse neste artigo, a história do “Circuito Asiático” inicia-se pouco depois da vitória da equipa Q4 no Campeonato Nacional Japonês.
Aichi Sendou e companhia são convidados a participar neste novo torneiro que, como o nome sugere, passa por vários países do continente asiático. Mas a partida não é dada sem antes haver uma perda global de memória, resultante do que se está a passar no Planeta Cray (onde residem os clãs e as criaturas das cartas), que força Aichi, Toshiki Kai, e Ren Suzugamori a jogarem Cardfight!! Vanguard com clãs diferentes dos seus eleitos: Royal Paladin, Kagero e Shadow Paladin, respectivamente.
O único que se apercebe desta mudança, ou seja, da alteração das memórias, é Aichi, graças a um contacto mal explicado que estabelece com uma nova personagem: Takuto Tatsunagi. Através de Tatsunagi, Aichi é levado de novo ao Planeta Cray, onde encontra justificação para o desaparecimento dos “antigos” clãs. Acontece que Tatsunagi é também o principal responsável pelo “Circuito Asiático”, sendo esse um aspecto determinante para Aichi se alistar no torneio continental, uma vez que o rapaz saberá mais sobre tudo o que se está a passar, para lá do encontro espiritual prematuro que já teve com ele.
E é desta forma, a meu ver, sem grande nexo, que a sequela se inicia. Um mau arranque que nunca mais se endireitou. Com tantas maneiras possíveis para fazer a ponte entre as séries, e a respectiva troca de clãs nas personagens principais, a fim de promover os novos clãs e as novas cartas do jogo, a produção optou por esta mudança brusca dos acontecimentos que, mesmo tratando-se de uma transmissão para um público mais jovem, não deve evitar que mesmo eles franzam o sobrolho perante um arranque tão inesperado e muito mal justificado.
Logo aqui, fica a ideia que os responsáveis de Cardfight!! Vanguard Asia Circuit pensaram em como adaptar a história à necessidade dos conteúdos que tinham de promover nestes 39 episódios, e não o contrário, para desgosto dos fãs e dos curiosos em saber mais sobre este jogo da Bushiroad.
PSYqualia – Um poder que deu jeito
Outro aspecto que me leva a pensar que esta segunda série foi pensada a partir das cartas e clãs que era necessário publicitar, e não do que já havia sido transmitido na prequela, é o poder PSYqualia.
Esta capacidade, exclusiva de algumas personagens da história, foi dos escassos nós que ficaram por atar na primeira temporada. A par da ligação entre os jogadores e o Planeta Cray, este poder, que eu admito nunca ter visto com bom olhos, exigia novos desenvolvimentos nesta continuação da trama, a fim de clarificar a carga sobrenatural que compõe a história.
Pois bem, a sequela chegou, mas o poder não evoluiu de forma significativa. Em parte, porque a chegada de um outro clã (Aqua Force) desviou o centro das atenções nos momentos mais importantes. Mas isso não justifica tudo. Sem transformações ou minificações, PSYqualia apareceu em Cardfight!! Vanguard Asia Circuit quase em exclusivo para alongar episódios ou para forçar duelos que, na sua ausência, seriam injustificados ou inexistentes. Portanto, em termos prácticos, ou contributivos para a qualidade global da série, de pouco serviu.
Um enredo todo ele insistente
Infelizmente, não é apenas pela premissa inicial e pelo uso “interesseiro” de PSYqualia que esta franquia desceu muito de qualidade em relação à produção de estreia. Vários são os acontecimentos que apontam nesse sentido.
Nomeadamente, episódios que não têm razão de existir (parecem mais fillers de uma adaptação manga do que outra coisa); a mudança de ritmo desenfreada e o fast-forward que acontece em alguns episódios; e mesmo a falta de evolução das personagens, como é o caso de Aichi Sendou.
Ao contrário do que dizem certas personagens em determinado momento da trama, isto é, que Aichi se tornou um líder desde que o conheceram, a mim não me parece de maneira alguma que essa característica seja aplicável a esta personagem, tendo em conta a sua postura neste Circuito Asiático. Aliás, já na primeira temporada esse “estatuto” não era sólido. Porém, as suas reacções a alguns acontecimentos deixaram essa hipótese em aberto. No que diz respeito à série em análise, o jovem Sendou nunca me pareceu estar tão longe de tal atributo. Na minha opinião, Aichi é uma personagem estática, onde parece que tudo lhe vai parar às mãos por mero acaso e não por mérito ou iniciativa. Como se não bastasse, é o afastamento do ecrã de personagens como Toshiki Kai e Ren Suzugamori, entre mais uma ou outra personagem, que tentam abrir essa possibilidade de Aichi ser um líder. Ou seja, como não se vê nenhum verdadeiro líder à sua volta, tenta criar-se essa ilusão de algo que ele não é.
Ainda sobre o elenco, de mencionar que todo ele se dispersa demasiado. Esta produção é mais curta que a anterior, e nela entram algumas novas personagens. Como tal, e salvo o principal antagonista, que recebe alguma atenção na parte final (por consequência de assumir esse papel), a exploração das restantes personagens dispersa-se (inclusive Takuto Tatsunagi). As mais antigas, que aqui poderiam ganhar mais consistência, infelizmente vêm o seu tempo fora dos jogos (e sobre este assunto, já lá vou de seguida) ser aproveitado para peripécias quase todas elas irrelevantes.
De facto, a única personagem da qual consegui extrair alguma satisfação foi Kamui Katsuragi. Volta e meia pelas suas expressões com palavras trocadas, e noutras ocasiões pelo seu estilo muito próprio de estar num duelo e girar as cartas de jogo.
O TCG no Anime
Relativamente à promoção em si do TCG no Anime, que é claramente o objectivo desta produção, de realçar que continua a ser o melhor conteúdo, mas cuja qualidade também desceu um pouco em termos de jogo. À semelhança do que acontece com as peripécias fora dos duelos, também estes embates derivam demasiado (seja pela mudança de cena, seja porque a produção carrega no botão do já referido fast-forward), sendo o espectador apenas bafejado na maioria dos confrontos com partes do duelo. Com demasiada frequência, corta-se a experiência como um todo e isso, naturalmente, é prejudicial à série e às personagens envolvidas. Com efeito, perde-se os seus raciocínios e restringe-se as personagens às formas mais básicas do seu ser.
Posto isto, sobra apenas a apresentação de novas cartas, novos clãs, e do novo “poder” presente em algumas dessas cartas recém-chegadas: o Limit Break que, sinceramente, me parece uma inclusão meramente satisfatória. Quero dizer: o jogo passaria bem sem ele, e não passa melhor com esta adição. Pelo lado mais positivo, tenho obrigatoriamente de referenciar a apresentação da carta “Ultimate Dimensional Robo, Great Daiyusha”, que acontece no episódio 17. Com grande probabilidade, o melhor momento deste segundo projeto anime da franquia.
De volta ao tema do Limit Break, saliento que a minha opinião sobre esta habilidade se baseia naquilo que o anime mostra e no jogo oficial de Cardfight!! Vanguard. Quando se fazem alterações às directivas do jogo, como acontece no Circuito Asiático, as coisas mudam de figura. A viagem pela Ásia traz à série várias derivações das regras standard do TCG. Modos de jogo alternativos que, na maioria dos casos, são interessantes, ou pelo menos engraçados, sendo aqui que o Limit Break melhor encaixa.
Aspectos Técnicos
Em relação à animação da trama, a dita cuja parece seguir a mesma linha do anime de estreia. Ou seja, mantém-se por um nível razoável, embora tenha ficado com a ideia que erros nesta parte técnica, mais notórios e frequentes em determinada altura da prequela, quase desapareceram por completo. Ou pelo menos não são tão evidentes e passaram de supetão pelo meu olho de mero mortal.
A banda sonora também não foge muito ao que nos habituou, mas há algo a dizer sobre os openings e endings. Começando pelo fim, ainda que ao seu estilo mais juvenil, de um modo geral tanto os vídeos como as músicas são agradáveis. O opening, que é único ao longo dos 39 episódios, apresenta grande qualidade nas duas vertentes, mantendo em posição de destaque a banda JAM Project. Todavia, até aqui há algo a lamentar. Esta banda – grande impulsionadora do anime na série anterior, quer nos vídeos de abertura, quer em alguns momentos em que tocava nos episódios – também viu diminuída a sua presença nesta viagem pela Ásia, e a sua qualidade um pouco afectada. A meu ver, a música de abertura, intitulada “Limit Break“, não consegue atingir o patamar elevadíssimo em que se colocaram os hits anteriores “Vanguard” e “Believe in my existence“.
Juízo Final
Na minha opinião, enquanto considero a série inicial como apelativa q.b. para adeptos e não-adeptos deste TCG, miúdos e graúdos, o mesmo não posso dizer da série aqui em análise. A produção não tem qualidade suficiente para cativar qualquer tipo de público, tornando-se mesmo numa travessia árdua para os jogadores do TCG que sintam necessidade de ver o anime, seja para aprender algo mais sobre as cartas introduzidas no decorrer desta série, seja sobre as possíveis alternativas que o jogo pode oferecer.
Cardfight!! Vanguard Asia Circuit é uma verdadeira manta de retalhos. O resultado final sugere que os seus responsáveis tinham como objectivo incluir, obrigatoriamente, vários elementos na história. Tudo o “resto”, como tornar o enredo mais sólido e conexo, foi relegado para segundo plano.. Sendo provável que este desleixo não leve os jogadores de Cardfight!! Vanguard a abdicar da franquia televisiva, ele pode ser visto como uma porta que se fecha para novos fãs.
Nos dias que correm, acredito que os TCGs e jogos de tabuleiro que estão ligados a livros, obras cinematográficas, anime, etc, podem e devem beneficiar dessa conexão. Isto é, a qualidade de um canaliza muita gente para a adaptação ou inspiração que está do outro lado, e vice-versa. Por outro lado, quando um dos lados é fraco, essa ligação fica comprometida e muita gente não arrisca a travessia.
Cardfight!! Vanguard: Asia Circuit – Opening
Análises
Cardfight!! Vanguard: Asia Circuit
Uma sequela que perdeu qualidade em todas as vertentes, quando comparada com a sua prequela, e o que trouxe de novo foi insuficiente para atenuar o declínio.
Os Pros
- Openings e Endings
Os Contras
- O enredo
- O ritmo intermitente com que se pautam os jogos e os desenvolvimentos da história