Comet Lucifer conta-nos a história de um mundo, outrora dominado por uma guerra sangrenta, coberto de brilhantes cristais azuis, ou o seu nome técnico Gifdium. O nosso protagonista, Sougo Amagi vive numa cidade chamada Garden Indigo, uma metrópole que tem prosperado com a extração desses mesmos cristais. Sougo tem o hábito de colecioná-los. Num pacato dia ele é inserido involuntariamente numa briga imbecil entre dois amigos. A brincadeira não corre como esperado e o nosso herói acaba preso numa gruta. Entre pedregulhos e ruínas, ele encontra um lago subterrâneo e pouco tempo depois um cristal que se materializa numa rapariguinha de cabelo azul e olhos vermelhos.
Quando fiz o artigo de Primeiras impressões, há três meses atrás, afirmei que a premissa não despertava em mim grande entusiasmo. Contudo não deixava de ser algo que agradava à maioria da comunidade. Aparentemente, Comet Lucifer não parecia realmente trazer algo de novo para o pequeno ecrã. Mesmo reticente, eu dei-lhe uma oportunidade.
O primeiro episódio do anime foi realmente confuso. Muita informação foi transmitida sem realmente conter algum nexo. Mesmo que eu, pessoalmente, considere que não foi a maneira mais inteligente de iniciar a série e de captar a atenção dos espectadores, não condenei a obra.
Nos vinte minutos iniciais deram-nos a entender que a trama seria palco de inúmeras lutas de mechas gigantes e que existiam fortes problemas sóciopolíticos a serem resolvidos. Pelo pouco que entendi pude averiguar que a realidade em que os personagens viviam se encontrava instável.
É aqui que começa a “expectativa vs. realidade”. Mesmo que Comet Lucifer não fosse dos animes mais esperados da sua temporada, o hype fora criado. Se no primeiro contacto com a saga, eu acreditei que a ação seria o foco da produtora, nos seguintes episódios fizeram o favor de tornar o anime num Slice of Life. Nada acontecia, os protagonistas pura e simplesmente passavam o dia-a-dia com a Felia (a rapariguinha materializada do cristal) e mostravam-lhe a cidade. De vez enquanto surgia um mecha gigante vindo não sei de onde para fazer não sei o quê e ia embora pouco tempo depois.
Foi aí que eu comecei a ficar sinceramente aborrecida. Afinal, tínhamos apenas doze episódios. Não existia tempo para brincar às casinhas. Nada de grandioso acontecia e quando finalmente a história se preparava para avançar conseguiu ficar tudo pior do que já estava.
O maior problema de Comet Lucifer é simplesmente não existir uma história credível e coesa. Os episódios passam e tu não entendes absolutamente nada. Não te dão explicações. Se quiseres aceitar, aceitas. Se não, vais assistir outra coisa.
Sabemos que existe uma organização muito poderosa que quer sequestrar a Felia a todo custo. E isto torna-se ridículo logo aqui. Tu sabes que a jovem tem poderes, mas em nenhum momento justificam o porquê de a ambicionarem tanto. Então, em vez de elaborarem um enredo minimamente decente onde a rapariga seria raptada e os amigos iriam salvá-la, digamos que ela é levada pela organização umas vinte vezes e trazida de volta pelos protagonistas umas vinte e uma. Em todo o santo episódio a miúda desaparece e retorna ao final de uns minutos.
O anime nunca teve um foco. O seu objetivo passava por salvar a Felia, encontrar o altar do abismo, salvar a Felia, lutar contra a organização, salvar a Felia e impedir a destruição da Terra. Não existiu uma hierarquização dos problemas. Enquanto salvavam a Felia encaminhavam-se para o altar, faziam umas lutazitas de mechas pelo meio e pronto.
Eu não estou a ser sarcástica, é literalmente esse o desenrolar da trama até aos últimos três episódios. A sensação com que fiquei é que a produtora começou a elaboração do anime sem saber como a história terminaria. Parece realmente escandaloso o que eu acabei de afirmar, mas vamos pôr as coisas assim:
- Os primeiros cinco episódios podem ser resumidos com esta expressão: Inchação de linguiça.
- Do episódio seis ao nove andaram simplesmente a brincar às caçadinhas.
- Nos últimos três episódios lembraram-se que teriam de dar um desfecho à história e literalmente, tiraram o final do rabo. Criaram personagens novos, continuaram sem dar explicações do que estava a ocorrer e inseriram um novo vilão na trama.
Por volta dessa altura também se lembraram que seria interessante criar uma vertente de drama, então decidiram mostrar o passado muito triste de certas personagens. Mas adivinhem: não foi triste, não emocionou e quando estava a ficar interessante decidiram voltar aos mechas. Simplesmente, o anime não dá ênfase a nada específico e tenta abordar diversos assuntos ao mesmo tempo.
Comet Lucifer | Personagens
Como se a elaboração medíocre do enredo não bastasse para enervar uma pessoa, quando se fala das personagens, Comet Lucifer cava um buraco ainda mais fundo. Nas Primeiras Impressões também comentei sobre o facto de os protagonistas serem genéricos. Doze episódios depois posso-vos confessar que não são só clichés, são basicamente mal elaborados e com personalidades precárias.
O tamanho da fossa é tão grande que não existe nem um que se aproveite. A maioria só marca presença no anime para conduzir mechas e pouco mais. Nenhum deles tem uma backstory ou uma construção decente. Um aspeto bastante curioso é que ninguém ali se questiona sobre a Felia, como se fosse estupidamente normal raparigas saírem de cristais. Ninguém faz perguntas, apenas a levam para casa e submetem-se a correr perigo de vida por ela. O enredo é tão deplorável que nem as personagens se interessam em saber o que se passa.
Sougo, o protagonista, é de tal maneira básico que chega a ser hilariante. Por um motivo sobrenatural, que até hoje ninguém entendeu, apaixonou-se pela Felia e formou com ela uma conexão inquebrável. Em nenhum momento se questionou do porquê da organização querer tanto a sua amada, limitava-se a correr atrás dos mechas que a raptavam.
A Felia não é uma boa personagem. Eu explico o motivo de ser possível apegarmo-nos a ela: é indefesa. É aquela típica personagem desajeitada que não consegue fazer nada sem ajuda. É fofinha e inocente, mas talvez por não entendermos direito o que ela exatamente é, torna-se apenas um adereço. Sem contar que ela é de tal modo poderosa que não consegue defender-se sozinha.
Isso é outra questão bem pertinente: se ela tem esse supremo poder porquê que não o usa? Porque é que têm de ser os humanos sem superpoderes a salvá-la? Pois. Só mais uma daquelas questões a que não temos resposta.
Os vilões da história são só isso. Não existe uma construção dos mesmos, foram lá colocados porque sem eles não haveria um ponto chave na história.
Comet Lucifer | Ambiente
A produção técnica é provavelmente a única coisa que se aproveita de Comet Lucifer. A 8-Bits fez um bom trabalho a nível da arte. O anime é simplesmente maravilhoso. As cores são saturadas, o contraste é ótimo e os cenários são muito detalhados.
Contudo a animação em si não é a mais fluída que já vi. As lutas de mechas não são nada de impressionante. A maioria até é bem aborrecida. A mecânica que a produtora usou nas batalhas não foi a mais adequada. Deu-me a sensação que os robôs gigantes não estavam bem encaixados no ambiente do anime. Pareciam saídos de outra obra.
A banda sonora é razoável. No geral, gostei do tema de abertura e das endings. O que me deixa de pé atrás em relação à qualidade da mesma é a música ambiente. Globalmente, as faixas agradavam-me, só que não eram colocadas nos momentos adequados. Durante uma das lutas a música que orquestrava a cena era algo meio gospel, música de igreja. Talvez seja também por esse motivo, que as lutas não fluíram muito bem.
Comet Lucifer | Juízo Final
“Após a visualização do primeiro episódio, não considero que o anime tenha aspetos necessariamente maus no sentido literal da palavra, afirmo apenas que existem alguns parâmetros duvidosos que, em um mau trabalho por parte da produtora podem conduzir a série a um épico falhanço.”
Esta foi a frase que usei para avaliar o potencial do anime, há três meses atrás. E eu estava certa. Comet Lucifer inicialmente não tinha nenhum parâmetro realmente crítico, tudo estava nas mãos de uma gestão inteligente por parte da 8-Bits. O que realmente aconteceu é que do primeiro episódio até ao fim não houve uma evolução. Os personagens não melhoraram e o enredo continuou confuso.
Comet Lucifer é um daqueles animes que tinha tudo para dar certo (conceitos, produção técnica, background) e que acabou por dar muito errado, revelando-se um grande cliché ambulante. Realmente, mecha está longe de ser o meu género favorito. Contudo, a questão não é essa. O anime não é bom em nenhum dos parâmetros a que se propõe.
Não souberam aproveitar o que tinham em mãos, com bom planeamento o anime podia ter-se tornado num drama de ficção científica incrível, mas no final tudo deflagrou numa obra pobre em todos os sentidos.
A meu ver um dos principais motivos para tal ter ocorrido é o facto de ser uma obra original. De não existir um manga, um visual novel ou um livro que guiasse a produtora.
Por vezes, considero que sou muito benevolente com os animes. Acabo por pegar em certos parâmetros e arranjar maneira de o defender e dizer-vos: não tem o melhor enredo, mas tem boas personagens. Não tem boas personagens, mas tem um enredo divertido. Contudo com Comet Lucifer eu não o consigo fazer. Não existe nenhum ponto que me faça afirmar que, apesar de todas as lacunas, ainda valerá a pena assistir. A arte do anime ter qualidade não salva, de todo, a obra. Foi dos piores animes com que me cruzei e dos que mais me desiludiu. Todos vocês têm uma shamelist enorme, então passem ao lado deste anime. É perda de tempo.
Análises
Comet Lucifer
Um anime pobre em todos os sentidos, que nem a maravilhosa arte o salvou de um falhanço épico.
Os Pros
- Nada de relevante a apontar
Os Contras
- Potencial desperdiçado