Ultimamente, tempo é coisa que não abunda por estes lados. Não é um factor relevante para ti caro leitor, mas o irónico é que esta fase de maior aperto está a ser atenuada pelo meu regresso ao “acompanhamento” de animes sazonais. De tudo o que está a sair esta temporada da primavera, estou a acompanhar apenas quatro, mas, esses quatro, foram um risco calculado.
Antes do início da temporada, seleccionei Spy x Family, Dance Dance Danseur e Summertime Render (este por recomendação), aos quais posteriormente se juntou Paripi Koumei – após ter visto alguns clips circular pelo AniTwitter e me aperceber que a P.A. Works estava a tratar da adaptação. Apesar desta selecção a priori, precisamente pela falta de tempo, estava mentalmente preparado para deixar cair um ou mais destes anime, caso o tempo me forçasse a escolher, ou sentisse que estaria a perder tempo. Até à data, os quatro permanecem na minha “programação semanal”.
Este preâmbulo todo para quê?
Em parte, para dizer que se algo nos toca ou nos faz “escapar” do que nos tira o fôlego, o tempo surge. Pode perder-se para sempre para outros assuntos, mas… A mente precisa de tantos cuidados quanto o corpo. Por outro lado, queria aproveitar esta “pequena maré” de anime que estou a acompanhar e falar um pouco sobre isso.
Este será um artigo teste com foco apenas num aspecto de Dance Dance Danseur e, dependendo de como me sentir no final da sua escrita, poderei abordar algo sobre os outros anime que referi, ou de outros do meu passado, presente e futuro.
Posto isto:
Dance Dance Danseur – Como o Junpei quebra o molde
O género de desporto em anime/manga toma muitas formas. Tantas, até, que vários temas não desportivos já foram abordados segundo a “metodologia” das narrativas tradicionais, p.e. Shokugeki no Soma.
Dance Dance Danseur, a meu ver, junta-se a Ballroom e Youkoso na categoria de obra que pretender aliciar para uma forma de arte, ballet e danças de salão, respetivamente, adoptando a vertigem e exaltação que advém dos chamados desportos convencionais – futebol, basquetebol, basebol, ténis, etc. O que torna este dois exemplares diferentes, é que o fazem sem desvirtuar as obras de arte que lhes estão subjacentes, mas colocando-lhes uma camada de verniz metafórica que vai permitir ao fã casual de anime, ou mesmo fã casual de anime de desporto, ficar curioso com o anime, com o manga (se for adaptação) e, quem sabe, com o próprio tema.
Adorava, por exemplo, ter a capacidade de reunir dados que me permitissem saber quantos se tornaram fãs de patinagem artística depois de ver Yuri on Ice. Não que eu espere que isso aconteça com ballet, mas, para ser sincero, eu próprio começo a ver esta forma de arte de outra forma apenas por observá-la através do protagonista de Dance Dance Danseur, Junpei Murao.
Dance Dance Danseur – A Diferença
Um dia terei que escrever, ou falar mais aprofundadamente, sobre o género de desporto em anime/manga e as suas várias vertentes narrativas e características. Contudo, e para não me alongar, quero tocar num dos pontos de partida de muitos exemplares deste género: seguir um novato no “desporto” que, ou por ter potencial inato vai desbravando o terreno tortuoso até ao sucesso ou, noutros casos, é a sua diligência/teimosia que o levam até ao topo do desporto.
Olhando para Ballroom e Youkoso, o Tatara acaba por descobrir a maravilha das danças de salão e parte completamente do zero. Ele é uma pessoa reservada, inseguro das suas próprias capacidades, que se sente despido de um objectivo e se vê rendido a este mundo. No caso do Tatara, a obra segue a rota do iniciante que graças à sua diligência e ao facto de se entregar por completo a algo, vai descobrir o seu lugar no mundo.
O que eu gosto no Junpei, é como é encarada a questão do novato. O primeiro contacto, explosivo, diga-se, que ele teve com ballet, surgiu muito cedo – na sua infância para ser mais concreto. O que o impediu de seguir esta forma de arte desde cedo, foram outros factores que eu vou evitar referir aqui porque são coisas que o anime aborda muito bem e eu não quero estragar a experiência a ninguém.
O que abona a favor da obra enquanto uma tentativa legítima de apresentar ballet ao mundo, é a forma plausível de como eles constroem o percurso do Junpei até ao presente, habilitando a audiência a creditar que este “novato” possa entrar no mundo do ballet numa idade “tão tardia”. Achei um pormenor delicioso, que em vários anime de desporto ou é ignorado, ou é dado ao protagonista algo inato que apenas precisa de ser desbloqueado. Contudo, no que toca a ballet, é essencial começar desde uma tenra idade muito por causa do corpo precisar de ser “moldado” para este estilo de dança/performance, e eu adoro o que fizeram com o Junpei.
Mas, há algo mais no Junpei que eu adoro e que, aliás, foi o aspecto que mais me motivou a escrever este artigo. Dizer que ele é uma pessoa com falhas seria meramente redutor, porque isso deveria ser o mínimo que se exige na escrita de uma personagem, sobretudo de um protagonista. O que, para mim, o torna diferente, é a sua confiança cega em quem ele é e, como aquilo que essa confiança projecta, choca constantemente com a realidade do palco que ele persegue.
A visão que o Junpei tem do ballet é bastante diferente da realidade e dá uma sensação de desrespeito para com a arte em palco (isto explicitamente ilustrado no final do recital do Lago dos Cisnes e posteriormente). É sobretudo neste ponto que assenta o seu “amadorismo”, o ponto de partida a partir do qual se estenderá, esperançosamente, a sua estrada para o sucesso. É muito interessante, divertido e emocionante ver o Junpei navegar as minuciosidades do ballet, o peso da sua história e as ambições de todos os outros que fazem deste mundo vida muito antes dele surgir a brotar de energia.
A personalidade dele traz frescura a um género que, geralmente, se vê revestido de reservados protagonistas que vão ganhando confiança, teimosos com a confiança fora do sítio, génios de poucas palavras, etc. Acho, sinceramente, que ele é uma excelente personagem POV para o mundo do ballet e, mais concretamente, para o radiante, belo, trágico, emocionante mundo de Dance Dance Danseur.
Dance Dance Danseur – Em Conclusão
Espero que este pequeno exercício vos ajude a ver obras assim com outros olhos e, sobretudo, vos incentive a dar uma oportunidade a Dance Dance Danseur, mesmo que ballet não seja algo que vos cative (o que é o meu caso). Anime/Manga têm este poder: o poder de, através de metáforas, através de personagens e realização apaixonante, tornarem qualquer tema interessante e cativante. Dêem uma chance!
E eu nem sequer falei das restantes personagens, como o Luou, a Miyako ou a Chizuru-sensei. Todos eles se complementam e, através das suas interações, enriquecem a obra, incluindo personagens ainda mais secundárias. Também nem falei na animação, o que para muita gente seria a primeira coisa a apontar, dada a quantidade de imagens que vejo a circular pelo Twitter. Podia igualmente falar da realização, sound design, performance vocal ou banda sonora, e, se quiserem, até posso vir a falar.
Contudo, aqui, hoje, quis colocar sobre a luz escaldante do holofote, um protagonista que está a fazer-me vibrar, tal quanto ele vibra com o “seu ballet” – algo difícil dada a minha tempestuosa-amorosa relação com os protagonistas do mundo anime/manga.
Espero que tenham gostado e, se derem uma oportunidade ao anime, comentem! Terei todo o gosto em falar com vocês sobre a obra. 🙂
Já que estamos no tópico “Anime da Primavera de 2022″…
Primeiras Impressões da Temporada de Primavera 2022 | Afonso Rocha