Em Chamas Análise – Filme Sul-Coreano

Filme: Em Chamas | Burning | Beoning (original)
Diretor: Chang-dong Lee
Escritores: Jungmi Oh, Chang-dong Lee, baseado na história de Haruki Murakami
Produtores: Soo Jin Hwang, Chang-dong Lee, Joon-dong Lee, Gwang-hee Ok
Cinematografia: Kyung-pyo Hong
Data de estreia: 16 de maio de 2019 (em Portugal)
Género: Drama, Mistério
Duração: 2h 28 minutos
Distribuidor: Alambique
País: Coreia do Sul

Em Chamas Análise – Filme Sul-Coreano

“Em chamas”, produzido pelo sul-coreano Chang-Dong, foi a minha estreia no mundo dos filmes coreanos. Este em especial transmitiu-me uma aura calma, mas ao mesmo tempo uma enorme ansiedade através do suspense e da intriga que acompanha as cenas ao longo do filme. Pessoalmente achei que o filme tem uma conotação forte e um estilo muito peculiar, devido à utilização de simbolismos interligados com sentimentos, bem como muitos outros aspetos.

Sons-Banda sonora vs sentimentos

O filme está muito bem construído a nível da conexão entre a história e a banda sonora. Visto que se trata de um thriller psicológico, os sons utilizados causam uma sensação de sufoco, de quietude, de suspense ou até de calma.

Estas sensações estão muito bem equilibradas em cada cena, proporcionando ao espectador uma aproximação aos sentimentos das personagens e ao ambiente de cada momento. Os planos de fundo e o posicionamento da câmara também jogam muito com estes dois fatores. Temos exemplos como: os pássaros a voar no céu, ou a visão de dentro de um autocarro ou de um carro, para um elemento no exterior destes.

Em Chamas – História

Em relação à história, esta começa com a apresentação da personagem principal de costas, Jongsu Lee, mostrando-nos o ambiente em que vive e o seu trabalho. Reparei que a história vai direta ao assunto logo de início, para não fazer esperar o espectador para o que vem em seguida. É aí que surge a segunda personagem principal, Haemi, antiga vizinha e amiga de Jongsu.

Os primeiros minutos do filme apresenta-nos o desenvolvimento deste reencontro e amizade entre os dois amigos.

Descobre-se o estilo de vida e ao de leve a história de cada um, bem como acontecimentos passados no decorrer das ações. Jongsu é um rapaz que acabara a universidade e que trabalha. Haemi diz que é livre e que gosta do trabalho que faz.

Gostei muito de uma cena logo de início num café, em que Haemi está a descascar uma tangerina e a comê-la, fazendo mímica com as mãos e gestos faciais (uma cena engraçada e rara de se ver). É quando Jongsu diz-lhe que ela tem jeito e ela repete que não tem a ver com jeito, que tinha a ver com o pensamento. Gostei da frase que ela a seguir referiu:

Não penses que “está” aqui uma tangerina… esquece é que “não está” aqui uma. É esse o segredo.

São estes momentos mais filosóficos que põem em funcionamento o teu raciocínio e que dão um toque mais intenso ao filme.

Há imensos detalhes ao longo da história, aos quais me questionei constantemente. Como a existência de um gato no apartamento da Haemi, o qual Jongsu achou ao início que seria imaginário (pois não o via) e uma causa para ela o ter levado ao apartamento dela. Aspetos como o nome do gato ou pormenores que vão sendo dispostos ao longo do filme, são importantes para o espectador e até para a personagem, para perceberem se aquilo é real ou não. É interessante como o realizador deste filme nos vai dispondo certas peças, para no final do filme completar uma espécie de puzzle.

Há um ápice de acontecimentos durante o filme, como mudanças de planos entre a cidade e o campo, afastamento e aparecimento de novas personagens, como o Ben, um amigo que Haemi conhecera na sua viagem a África, entre muitos outros aspetos.

Tudo isto vai criando uma aura intrigante em torno da história, suscitando à curiosidade do espectador.

Em chamas – Personagens

Adorei o modo como exploraram a personalidade da personagem Haemi. Ao início parece ser uma pessoa feliz, aventureira e forte, mas vai-se descobrindo aos poucos que esta é sensível e que no seu interior é uma pessoa triste.

No entanto não se percebe bem qual o motivo para essa sua tristeza. Há várias partes na história em que a amiga de Jongsu expressa através de lágrimas ou da dança os seus sentimentos mais profundos.

Para mim uma das menções mais fortes que esta referiu, foi a vontade que ela tinha “de desaparecer como o pôr-do-sol”. Encontrei aqui um toque poético na maneira como esta expressou a sua angústia. Outra alusão foi a uma dança africana e os termos “Pequena Fome” e “Grande Fome” que mencionara logo no início do filme ao seu melhor amigo. É num encontro num café, com amigos de Ben, que esta explica que a dança da “Pequena Fome” é feita por aqueles que têm fome e que a da “Grande Fome” é encenada por aqueles que procuram o significado da vida.

Nesta cena do filme Haemi parece emocionada e realmente a sentir o real significado da dança. Todavia destacou-se uma aura obscura, de gozo e egoísmo à volta desta, por parte dos amigos de Ben, que a olhavam como se ela fosse um brinquedo para chacota. O olhar trocista mostrava a diversão no momento, que deveria ser sério. Por outro lado, Haemi parece não notar, continuando a dançar. Aqui destaca-se a sua inocência e humildade. Ao contrário desta, o seu melhor amigo nota o desinteresse dos convidados e a desatenção de Ben, enquanto boceja.

Características/detalhes da narrativa do filme

“Em chamas” é um filme imprevisível, pois não há uma única cena que possamos prever no seu todo. Fica-se sempre constantemente na expectativa. De um momento a outro passa-se de uma cena num café moderno, para uma casa no meio do campo. Como quando Ben e Haemi visitam Jongsu e se destaca a diferença entre a hospitalidade e comunidades entre uma pessoa rica como Ben e uma pessoa humilde como o protagonista.

É nesta parte que acontece uma das minhas cenas favoritas deste filme, na qual a música e a natureza envolvem totalmente Haemi, enquanto esta dança. A orquestra e a música jazz que acompanham os movimentos dela, mais o silêncio do momento, acompanham a aura e o humor de Haemi. Por momentos, pareceu-me que esta procurava a sua “Grande Fome”, a partir da dança.

Uma característica deste filme é o movimento, que é dada a partir das mudanças de cenas, dos movimentos das personagens e da presença de filmagens dentro de automóveis. Mais para o final do filme o movimento é quase que permanente. É como se o clímax da história tivesse a chegar a partir de uma tempestade de acontecimentos repetitivos. Isto é característico principalmente na corrida que o protagonista começa a fazer constantemente pela aldeia, pela procura de Haemi… Um turbilhão de sentimentos em volta do desespero e ansiedade. E mais não digo para não me precipitar nos detalhes da história.

Já nos minutos finais o espectador é bombardeado de pontos-chave que o levam a concluir facilmente o rumo dos acontecimentos. Na minha opinião nunca pensei que a história fosse ter um final igual. Muito sinceramente, fiquei impressionada com a construção desta e o modo como jogaram com certas palavras, para depois no final tudo se conectar tão facilmente. Eu senti inúmeros presságios desde o início do filme e imaginei logo diversas situações quando certas palavras ou momentos foram mencionados novamente, já quase na etapa final.

Juízo Final

“Em chamas” aborda a história de dois amigos, na qual as suas decisões, amizades e passado irão influenciar o destino das suas vidas. Uma narrativa complexa, que nos dispõe a visão da personagem principal Jongsu Lee, em relação ao seu percurso na história e ao das restantes personagens do filme.

O filme em si tem um carisma forte e calmo ao mesmo tempo. O título tem o seu significado expresso de inúmeras formas, mas também de uma forma objetiva, como é o fogo de uma fogueira ou o fogo de um incêndio. Se gostas de emoção, de sentimentos à flor da pele, de tentar adivinhar o rumo de uma história, de mistério constante por detrás das personagens e dos acontecimentos, então aconselho-te a ver este filme!

Agradecimento:

Distribuidora Alambique (Website, Facebook)

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