Numa temporada liderada por Kill la Kill e Log Horizon, Nagi no Asukara é, até hoje, um anime que se encontra na sombra dos louvados. O Outono de 2013 presenteou-nos então com uma das obras mais peculiares com que já me cruzei. Porém numa indústria onde os grandes apenas se tornam maiores, histórias tão especiais como esta precisam de ser faladas e divulgadas. Como redatora no ptAnime e como fã incondicional de anime, é minha função dizer-vos o que vale a pena, independentemente de números.
Nagi no Asukara | Enredo
Nagi no Asukara conta-nos a história de uma realidade alternativa. Desde os tempos mais remotos, a civilização humana vivia no fundo do oceano. No entanto, muitos humanos tinham o sonho de um dia poder viver na superfície, o que acabou por acontecer. Tal fenómeno gerou uma separação na espécie humana e duas culturas diferentes foram criadas.
O anime segue em particular a história de quatro adolescentes que sempre viveram no mar. Certo dia a sua escola fechou e estes viram-se obrigados a frequentar o ensino da superfície. Agora, convivem abertamente com os seus semelhantes fora do oceano, porém rodeados com perspetivas diferentes.
Quem tem por hábito ler as minhas análises, já deve ter verificado que sou bem mesquinha com a maioria das premissas. Porém, esta em particular intrigou-me. Finalmente temos algo que não apela a superpoderes exóticos ou a uma sociedade que vive no apogeu de um apocalipse. É uma perspetiva simplesmente diferente e cativante, principalmente para quem, assim como eu, tem uma paixão exuberante pelo mar.
A possibilidade de conhecer dois mundos num só anime conquistou-me e engrenei na aventura. Aventura essa que nos seus primórdios possuía um ritmo típico de Slice of Life. Acompanhávamos a rotina de quatro jovens amigos com personalidades diversificadas que saíam do mar e se encaminhavam para a escola. A grande diferença é que aqui as brigas surgiam devido às diferenças culturais.
São todos seres humanos, eu sei. E de certa maneira as culturas não são assim tão opostas ao ponto de se gerar tais guerras. No anime temos a perceção que existem alguns costumes diferentes. Na terra comem mais carne, no oceano comem mais peixe. Na terra a diversidade genética é maior, no oceano todos têm olhos azuis.
O maior problema é, sem dúvida, a mentalidade fechada no povo do mar. Não conseguem perdoar o facto de muitos humanos se terem ido embora e voltado as costas aos seus princípios. O povo da superfície nega qualquer “traição” ao oceano e a briga continua.
Quando Hikari, Manaka, Chisaki e Kaname começaram a passar grande parte do seu dia na terra acabaram por conviver de perto com esse preconceito. Os colegas não gostavam deles, os mais velhos olhavam-nos de lado e era assim o seu dia-a-dia.
O anime exemplifica e mostra de maneira brilhante o que é o racismo – um preconceito que vai muito além da tonalidade da pele e da cor dos olhos. Algo que está entranhado de modo crítico na sociedade. Retrata a dificuldade do ser humano em aceitar o diferente, a dificuldade que os mais jovens sentem quando querem fazer algo inovador.
Realmente o foco da trama acaba por ser um grupo de jovens que vivem na linha central de um conflito entre nações e que dali para a frente terão de lutar por um futuro mais acolhedor. Contudo, Nagi vai tão além disso! Inúmeros temas são abordados. Pessoalmente, um daqueles que mais me emocionou foi a questão da “luta”. O anime reforçou várias vezes a importância de correr atrás do que acreditamos. De continuar em frente independentemente da probabilidade de dar errado e de trabalhar em equipa. A necessidade de se submeter a determinados sacrifícios para atingir os fins.
O enredo de Nagi é delicadamente simples e maravilhoso. A história que envolve os protagonistas é extremamente rica em conteúdo, em poderosas mensagens e em bonitos significados. Não deixa de ser uma aventura contada num tom entristecedor, é realmente difícil imaginar o que os personagens sofrem para conseguirem alcançar os seus objetivos. Apesar de existirem enigmas constantes e mistérios avassaladores, a beleza da história está contida em pormenores minimalistas. É incrível como num mundo de pura fantasia conseguiram encaixar conceitos que são-nos tão familiares.
Regra geral, animes de drama têm tendência a avançar devagar. Nagi não é diferente nesse aspeto. Os episódios passam, e nada de grandioso acontece. Reclamei tanto disto quando comecei a assisti-lo! Mas a verdade é que o tempo decorria e quando dei por mim já tinha visto metade da série. É simplesmente viciante, é como se fizesses parte daquele enredo e de um momento para o outro estás a sentir a dor deles. Porque as personagens sabem exatamente o mesmo que tu e descobres as respostas com o progresso da obra.
Nagi no Asukara | O que correu mal
Nagi está longe de ser perfeito e só não o é porque pecou em situações que poderiam ter sido evitadas. O que será que correu mal?
Como mencionei, o anime pode ser lento, mas nos primeiros 14/15 episódios nunca chegou a ser entediante. Pelo contrário, manteu um ritmo interessante, as coisas aconteciam, os sentimentos dos personagens eram explorados e havia sempre revelações a ser feitas. Até aqui estava tudo a ir de vento e popa.
Depois dos eventos chocantes que ocorreram no meio da saga, o anime perdeu alguma qualidade. Longe de mim afirmar que ficou literalmente mau! Digamos que o que aconteceu na primeira parte foi realmente emocionante e surpreendente, quando o assunto foi “resolvido” era extremamente complicado elevar imediatamente a fasquia. Então realmente houveram uns quatro ou cinco episódios um pouco parados, contudo valeu a pena “suportar” a parte mais monótona do anime. O que aconteceu no final da história foi maravilhoso e é definitivamente um dos melhores desfechos com que já me deparei.
Agora falemos do que realmente condenou o anime a uma nota mais “baixa”: o romance. Se por um lado Nagi até então se tinha assemelhado tanto à nossa realidade, quando se fala do amor, a obra pecou. As circunstâncias amorosas que envolvem os personagens são muito atípicas. Os triângulos amorosos são forçados e existe muita especulação a esse nível para no final tudo acabar como se esperava. Eu não me incomodaria tanto com este critério se isto não tivesse prejudicado os protagonistas. Porém, prejudicou significativamente. Alguns tornaram-se insuportáveis de tão in love que estavam.
Nagi no Asukara | Personagens
Os personagens de Nagi são engraçadas. Tem personalidades peculiares, mesmo sendo um pouco genéricas e algumas parvas. De um modo geral, diria que eram demasiadas personagens principais para haver um desenvolvimento coeso de todas.
Como um grupo de amigos, funcionaram exuberantemente. A relação entre eles é deveras semelhante à vida real. São bastante unidos, contudo têm os seus percalços. Nem tudo é sempre perfeito, existem problemas nas relações românticas e entre amigos também, a verdade é essa. Eles discutem, brigam, dizem que se odeiam e viram as costas, contudo nos momentos difíceis, unem as suas forças. E acompanhar o seu dia-a-dia nas ditas circunstâncias é fenomenal.
Vou-vos falar naquelas que mais me marcaram:
Hikari, o protagonista como mais destaque, era simplesmente irritante no começo. Só sabia reclamar, fazer birras e era perito em cenas de ciúmes. Quase tive vontade de lhe dar dois estalos. Porém com o avançar do anime a evolução deste é fantástica. Vemo-lo amadurecer perante os nossos olhos. Tornou-se uma das minhas personagens favoritas.
A Manaka, sempre foi a main mais cativante. Engraçada, era ela que trazia o humor para as cenas mais tristes. Sem dúvida que é aquela personagem que fica guardada no nosso coração pela sua coragem e personalidade genuína.
A Miuna não tinha grande destaque no início, contudo é das personagens mais importantes na segunda parte do anime. Como não é um tsundere ou uma adolescente retardada não chama tanto à atenção. Se calhar foi por isso que eu gostei tanto dela. Apesar de ser impulsiva e dramática demais, surpreendeu todos no final.
Destaco também a Chisaki e o Tsumugu, não eram revelantes inicialmente, mas tivemos a perceção da sua bondade com pequenas atitudes para com os amigos.
Nagi no Asukara | Ambiente
A P.A. Works é uma produtora que assim como Nagi, vive na sombra dos grandes. Porém é sempre notável relembrar que sucessos como Angel Beats e Another foram presentes da mesma. A arte do anime não é a melhor do género, existem dramas/romances com um ambiente mais propício ao desenvolvimento a que a obra se compromete. Mas no geral, o visual de Nagi é bastante bom. O cenário da vila do oceano é deslumbrante, o design das personagens (principalmente as marítimas) é muito bonito.
A banda sonora é mais um dos pontos fortes do anime. As duas aberturas da autoria de Ray são maravilhosas e transmitem de modo brilhante a carga emocional presente no anime. Adoro quando as openings/endings captam realmente a essência da obra – é um parâmetro importante para mim. Sem contar que a música clássica e triste ao longo dos vinte e seis episódios adequou-se plenamente à história. E engane-se quem pensar que apenas houveram faixas melancólicas a orquestrar o anime! A P.A. Works também nos presenteou com músicas mais alegres quando a cena o merecia.
Nagi no Asukara | Juízo final
É de louvar que num cenário completamente oposto à realidade, a obra tenha alertado para as consequências das diferenças culturais no nosso mundo. E evidenciou ainda o quão importante é assumir as nossas origens com orgulho.
É sem dúvida uma obra que recomendo a toda a gente. Quer sejam fãs de Slice of Life ou Shounen, pois as mensagens contidas na obra devem ser averiguadas por todos nós. Não deixem que a possibilidade de um ritmo lento vos assuste, no final tudo vai ter um porquê e vão ter absorvido muitas mensagens positivas que vos farão pensar.
Termino a minha análise afirmando com convicção que Nagi no Asukara é dos animes mais enriquecedores a que assisti. Só não digo que é um dos mais completos, porque pecou em alguns parâmetros desnecessários.
Análises
Nagi no Asukara
Uma obra que qualquer um deveria assistir, que aborda a realidade dos nossos e a fragilidade da vida humana.
Os Pros
- Enriquecedor
- Maravilhosas mensagens e temáticas
- Produção visual
Os Contras
- Nada de relevante a apontar