- Título: Senpai is an Otokonoko (Senpai wa Otokonoko)
- Adaptação: Web Manga
- Produtora: Project nº9
- Temporada: Verão 2024
- Género / Demografia: Drama, Romance
Olá! Bem vindos a mais um comentário de um anime que pode ter passado um pouco despercebido na passada temporada de verão!
Desta vez, escrevo com uma grande consciência de que este anime tem um público-alvo um pouco mais restrito do que os animes que normalmente comento ou que, pelo menos, as vivências destas personagens podem ser apenas parcialmente ressonantes com a audiência e, por isso, existir problemas em criar empatia no espetador.
No entanto, sendo uma história pouco usual que se aventura pelas águas atribuladas de 3 jovens que têm que navegar um mundo que, por definição, os considera “defeituosos”, achei que este anime merece um destaque especial. Para além disso, esta é capaz de ser a primeira história com um triângulo amoroso que eu realmente gostei… O que já é, em si só, um feito extraordinário.
Afinal de contas, o que é que este anime faz melhor que os outros na minha opinião? O que o torna especial?
Opinião Anime – Senpai wa Otokonoko
Este comentário contém pequenos spoilers para o anime!
Um triângulo amigável e amoroso
Começando por introduzir o nosso trio maravilha, temos: uma pessoa não binária que usa perucas, uma bissexual que adora baleias e um gay estudante de topo. De facto, Makoto, Aoi e Ryuji são mais um trio de amigos amoroso do que membros de um triângulo de intrigas românticas, e para mim este é o aspeto que torna este anime tão único, comparado com outros tantos.
A amizade deles é perfeitamente orgânica, especialmente se tivermos em conta que é nos momentos em que eles andam nas compras a gastar dinheiro em coisas engraçadas e a conversar casualmente sobre cenas idiotas, que eles podem ser genuinamente quem são. Eles são o “lugar seguro” uns dos outros, e eu conseguia ficar horas e horas a fio só a ouvir as conversas fascinantes destes três.
É claro que os desenvolvimentos românticos causam atrito e confusão, mas o sentimento de amizade prevalece acima de tudo neste grupo. Por isso mesmo, este anime é desprovido de lutas mesquinhas para ver quem passa mais tempo, quem dá o presente tal, quem consegue um encontro com o protagonista predileto amaldiçoado com demasiados afetos. Eu até acho que existe uma invulgar mútua condescendência de Ryuji e Aoi que estão apaixonados pela mesma pessoa mas gostam demasiado da companhia um do outro para se prejudicarem no processo de lidarem com os seus sentimentos e hormonas saltitantes. Para mim, que nunca gostei de dramas desnecessários só para avançar o plot e amigos separados por causas românticas, este tipo de dinâmica é um bênção.
O caminho mais fácil nem sempre é o melhor – Senpai wa Otokonoko
Makoto, a personagem principal e o centro do grupo de amigos LGBTQI+, é sem dúvida quem anda mais pelas ruas da amargura. A sua mãe faz questão de impor que Makoto se comporte como um “verdadeiro rapaz”, banindo qualquer coisa “fofinha” ou cor de rosa por mais mínima que seja. Este reforço sufocante de estereótipos de género tóxicos chega ao ponto dela não deixar Makoto tocar na bancada da cozinha porque “as raparigas é que cozinham”. Minha senhora, nós estamos no século XXI por amor de deus, qualquer pessoa tem que saber fazer pelo menos um ovo estrelado.
Por isso, para além da opressão diária em casa, Makoto está ainda à mercê dos bullies da escola e da sociedade no geral.
Assim, enquanto Makoto navega as suas dúvidas e receios acerca da sua identidade de género é obvio que chega à conclusão que tudo seria muito mais fácil se fosse apenas “um rapaz” ou até mesmo uma “rapariga”. Contudo, a violência psicológica que advém de suprimir a sua expressão de género é terrível, e o anime faz um excelente trabalho ao representar que muitas vezes, é necessário ir contra o socialmente, e até o pessoalmente conveniente por amor próprio. E é claro que quem ajuda Makoto a valorizar as coisas que lhe são preciosas, ganhando coragem para viver abertamente a sua identidade, são os suspeitos do costume, os besties Aoi e Ryuji.
Para mim, Makoto é quem mais representa a mensagem principal de Senpai is na Otokonoko: contra tudo e contra todos, devemos viver plenamente fiéis a nós mesmos. Para tal, precisamos de uma boa dose de coragem, amor próprio, e uma enorme fé de que o nosso caminho não é errado só por ser diferente. A felicidade que realiza cada pessoa é tão variada quanto nós somos enquanto espécie humana e, por isso, há que procurá-la. É com esta inevitabilidade que Makoto, Ryuji e Aoi se deparam: eles não podem ser ninguém para além de eles mesmos.
Metáforas e analogias marinhas?
Vou confessar que não era a maior fã da Aoi quando ela foi introduzida. Numa primeira impressão, ela pareceu-me um pouco intrometida e descarada, mas rapidamente mudei de opinião, e de que maneira. A Aoi tem um desenvolvimento surpreendente, que espelha as próprias inseguranças de Ryuji mas com uma pepita de vazio emocional e medo de abandono.
Para além de ser a autointitulada “aprendiz” de Ryuji, é ela quem tem mais influência na autoaceitação de Makoto, incentivando a nossa personagem principal a comprar os itens fofos, supostamente “para raparigas” que tanto adora. Mas, tal como diz o ditado “faz o que eu digo não faças o que eu faço”, Aoi não é a mestre do amor próprio e está tão perdida no meio de sentimentos confusos quanto Ryuji e Makoto. Ela é a prova que o amigo que faz de terapeuta do grupo se calhar é o que precisa mais de uma sessão de terapia urgente.
Mas, deixando os aspetos deprimentes de lado, no final do dia a Aoi é uma rapariga extrovertida, expressiva e engraçada que adora a vida marinha. Aliás, adoro o quão perspicaz ela é para fazer analogias marinhas. Especialmente quando ela diz ao Makoto e ao Ryuji: “as baleias conseguem comunicar a 50km de distância, mas vocês os dois são humanos, por isso juntem-se e resolvam os vossos problemas”. Por alguma razão, achei esta frase genial e um sinal da maturidade emocional destas personagens e deste anime.
Alexa, toca “Good luck babe!” de Chappell Roan
O Ryuji é a minha personagem favorita. Eu adoro o quão atencioso, protetor e dedicado ele é. Para além disso, o Ryuji é o coração dos melhores momentos de gay panic que já tive a honra de presenciar (só o Uenoyama de Given lhe faz frente) e por isso a alma da comédia. Infelizmente, todos nós sabemos que as personagens mais cómicas estão, na verdade, a morrer por dentro, e Ryuji não é exceção com a sua homofobia internalizada.
Porém, Senpai is na Otokonoko não se limitar a mostrar os momentos auto depreciativos do Ryuji que me doeram tanto quanto um murro no estômago. O anime representa, de forma magnífica, a jornada de autoaceitação de Ryuji, o bom e o mau, o desejo profundo de ser “normal” para viver confortavelmente em conformidade com a sociedade, e a inevitabilidade de “ser diferente” e a pequena satisfação de estar livre dos estereótipos e espetativas dos outros
Contudo, ser diferente exige muita coragem, e mesmo com os seus brincos novos e uma corrida rumo a um futuro melhor, Ryuji é realista o suficiente para vacilar em reconhecer a legitimidade dos seus sentimentos, para duvidar se poderá viver assim. Ou seja, o maior obstáculo de Ryuji não é propriamente a sua amiga Aoi, mas sim, os limites que ele coloca a si mesmo e que adensam o drama da história de forma muito interessante
Animação colorida e coerente
Não podia deixar de comentar a animação de Senpai is an Otokonoko, mesmo que ela seja, em parte, uma animação menos original mas sempre coerente. Nem todos os animes têm que ser uma obra prima avant-garde, e a animação do estúdio Project nº9, do qual nunca tinha ouvido falar, marcou pela positivo. Apesar de ter uma abordagem mais convencional, a animação tem cores muito vívidas e acaba por ser única na sua utilização inteligente de chibis simplistas que dão um tom mais cómico e descontraído à série nos momentos apropriados.
O estúdio de animação também mostrou um grande cuidado em se manter fiel à Web Manga (que fiz questão de ir espreitar), dando um novo relevo a este tipo de media ainda menos explorado que os tradicionais mangas. Tal como outras adaptações de Web mangas, como Tower of God, God of Highschool e Solo Leveling, Senpai is an Otokonoko é mais uma prova que é possível fazer adaptações de grande qualidade deste tipo de literatura digital.
Senpai wa Otokonoko – Só podes ser quem és!
Conclusão
Senpai is an Otokonoko é um anime invulgar com um triângulo amoroso que funciona porque, acima de tudo, Makoto, Ryuji e Aoi são ótimos amigos. Todos eles percorrem uma árdua jornada de autoaceitação por caminhos diferentes, o que complexifica e torna mais interessante o drama romântico que se desenvolve entre eles. Contudo, esta não é uma história de intrigas polémicas e jogos psicológicos. Esta é uma história realista sobre as dificuldades de ser jovem e fazer parte de uma minoria que a sociedade rejeita. Afinal, se ser-se jovem já implica ter que processar muitas mudanças em muitas frentes, ter que lidar com preconceitos sociais é atirar mais lenha para a fogueira de sentimentos incertos e pensamentos confusos ardentes.
Por isso mesmo, através da amizade orgânicas de Ryuji, Makoto e Aoi, Senpai is an Otokonoko destaca a importância de ter nos amigos um sistema de suporte onde nos sentimos seguros para sermos quem somos, nas nossas diferenças e semelhanças. Mais do que um anime acerca das dificuldades das pessoas LGBTQI+, acredito que Senpai is na Otokonoko pode tocar todos os nossos corações com o seu convite para abraçarmos a nossa própria felicidade, seja ela qual for, com coragem e determinação, independentemente do que os outros possam pensar.
Agora, pós o fim desta temporada, aguardo com curiosidade o que nos reserva o filme que irá dar continuidade a esta história tão única!
Até uma próxima análise!
Análises
Senpai is an Otokonoko - Análise e Opinião
Senpai is an Otokonoko é uma história única que nos transmite a importante mensagem de que o caminho da autoaceitação é um jornada difícil mas necessária. Com uma animação simplista, mas coerente e vibrante, Senpai is an Otokonoko destaca-se dentro dos animes do seu género para tocar em temas que merecem mais representação.
Os Pros
- Todas as personagens têm desenvolvimentos interessantes
- Abordagem de temáticas pouco comuns
- Mensagem positiva de autoaceitação e importância da amizade
- Animação colorida e coerente
Os Contras
- Temática que tem um público-alvo mais restrito
- Animação estilo chibi pontual pode desagradar alguns espetadores