Quase sete anos depois de apresentar neste espaço a série “Shingeki no Bahamut”, é tempo de voltar a escrever sobre ela, desta feita para uma apreciação final (e global) a este projecto da MAPPA. Já nesse primeiro texto, além de apresentar as personagens e a premissa da história com detalhe, salientei a originalidade e a irreverência da produção, características que lhe permitiram colher bons resultados nos episódios iniciais. Posto isso, o maior ponto de interrogação colocava-se sobre a sua capacidade em manter essa toada ao longo de toda a trama. Pessoalmente, fiquei convencido que sim, sendo essa perspectiva que hoje tenho para partilhar convosco.
A MAPPA desenvolveu esta história de raiz?!
Antes de mais, convém lembrar que Shingeki no Bahamut: Genesis foi inspirado num jogo social de cartas existente para Android e iOS, conhecido também pelo nome “Rage of Bahamut” (Shingeki no Bahamut). Ora, ao contrário do que acontece com adaptações manga, ainda que as personagens e alguns acontecimentos possam ser inspirados no jogo, tudo indica que o estúdo MAPPA terá tido de trabalhar arduamente o guião da história, a fim de lhe dar o mínimo de consistência. Sendo igualmente verdade, como referi no meu artigo inicial, que é notória a habilidade dos seus responsáveis em conduzir o espectador de forma a este relativizar o enredo, ainda assim, e com o avançar dos episódios, torna-se essencial ligar os vários acontecimentos, o que acaba por acontecer sem lacunas dignas de registo.
A concentração da atenção nas personagens
Ora, visto que o enredo propriamente dito foi secundarizado, onde esteve concentrada a atenção do espectador? Sem dúvida alguma, nas personagens. Com todo o mérito por parte delas, sou novamente obrigado a mencioná-las e a concentrar este meu texto em seu redor. Porque elas são o grande pilar desta obra, e a dita cuja não revelou necessidade de muito mais, salvo os aspectos técnicos, para se transformar numa obra de qualidade.
O trio principal, que pouco depois se transforma num quarteto, está muito bem conjugado. Amira, Kaiser e Favaro têm personalidades muito diferentes, o que torna a sua jornada toda ela imprevisível. Mais ainda quando se vêm envolvidos com as restantes facções desta história de aventura e fantasia: anjos, demónios, entre outras criaturas que, estranhamente, também têm, volta e meia, de unir forças.
Não são precisos muitos episódios para Rita (o quarto elemento) se juntar ao grupo. Ainda assim, por essa altura, já o espectador conhece o suficiente de Kaiser e Favaro para perceber que, a cada episódio em que estes se juntam, é uma questão de pouco tempo até se desentenderem … e voltarem a entender-se. Por seu lado, Amira não se preocupa muito com a relação entre os dois rapazes. De facto, esta personagem chave (no sentido literal e metafórico), não revela grandes preocupações para com o grupo. As disputas de Favaro e Kaiser não lhe tiram o sono, e, no que toca a inquietações, elas existem mais no sentido dos outros elementos do grupo para com Amira, dada a sua importância para o destino deste mundo mágico e os seus comportamentos algo imprevisíveis.
A conclusão que se pode tirar do parágrafo anterior é que aguentar este grupo reunido durante muito tempo parece missão impossível. Há quem diga que “a necessidade aguça o engenho” e, não sabendo eu que relação têm estas personagens no jogo (se é que têm alguma), parece-me fundamental salientar o aparecimento de Rita. Ultrapassada a primeira introdução aos protagonistas e à história, esta personagem entra em cena para conferir o mínimo de equilíbrio às “loucuras” dos seus companheiros. Pessoalmente, vejo Rita como o pêndulo que não permite ao restante trio – onde é difícil ler o que vai nas suas cabeças e, como consequência, adivinhar comportamentos – afastar-se demasiado do jogo de risco assumido pelos criadores desta série. Desta forma, enquanto o espectador fica agradado com os voos de Kaiser, Amira e Favaro, é Rita, “nos bastidores”, quem assegura que a história não sai do seu rumo e que a qualidade de Shingeki no Bahamut fique seriamente comprometida.
A diversidade dos ambientes
Contudo, convém não esquecer que este sucesso das personagens principais é, de algum modo, suportado por um outro parâmetro da produção: a qualidade do seus ambientes épicos e de aventura. Dele fazem parte personagens míticas e fantasiosas como dragões, anjos e demónios, entre outras criaturas, mas também humanos, como a eterna Jeanne d’Arc. Aqui, mais do que a imprevisibilidade, existe a necessidade da história passar por um grande número de ambientes muito diferentes uns dos outros, além de exigir coerência e co-habitação entre todo este tipo de criaturas diversas, com vista a assegurar a boa saúde do seu enredo.
Em resumo, a MAPPA fez uma dupla aposta de risco, ao conferir uma grande dose de imprevisibilidade ao seu núcleo de personagens principais e, ao mesmo tempo, ao juntar no seu elenco, e chamar à “boca de cena” sempre que necessário, um vasto grupo de diferentes criaturas. Embora em alguns escassos momentos o resultado não seja o melhor, regra geral, ele é bastante agradável.
Aspectos Técnicos
No meio de tantas jogadas arriscadas, é por via dos aspectos técnicos que podemos apelidar Shingeki no Bahamut: Genesis de consistente. Ao ponto de eu não ter practicamente nada a acrescentar à minha apreciação de 2014, escrita após ter visto os dois episódios iniciais da série. A arte visual e a animação são extremamente regulares, enquanto a banda sonora mantém a sua discrição do princípio ao fim, tornando-se pouco relevante. Por fim, quero apenas reforçar a qualidade visual e sonora do opening da série, pois creio ser de grande qualidade. Eu, que não sou um grande fã do estilo musical ali exibido, senti-me agarrado àquele vídeo de abertura.
Juízo Final
Em suma, Shingeki no Bahamut: Genesis atinge um patamar de grande qualidade por diversos motivos: pela maneira como contornou a ausência de um enredo sólido, concentrando a maioria dos seus esforços em criar personagens de qualidade e com grande capacidade de cativar o espectador com os seus comportamentos e atitudes; pelos ambientes diversos apresentados e muito bem trabalhados; pela qualidade de visualização assegurada pelos diversos aspectos técnicos;
No entanto, e olhando para os elementos do parágrafo anterior de uma outra perspectiva, creio que a obra tem muito mérito pelo resultado final alcançado, tendo em conta todos os riscos que correu. Porque todas as obras são diferentes, e umas têm mais material de base (chamemos-lhe source material) do que outras, o que normalmente lhes confere vantagem. Shingeki no Bahamut arrancou com pouco material e, por isso, teve de assumir grandes riscos para aspirar a um grande resultado. Porém, foi premiado por isso.
A terminar, dizer que na grande maioria dos episódios, que são 12, o resultado final do trabalho é seriamente positivo. Além disso, de salientar também a boa distribuição do tempo entre momentos de diálogo e de acção. Estes últimos, embora favoreçam umas criaturas mais do que outras, permitem a todas dar um ar da sua graça. Série recomendada!
Shingeki no Bahamut: Genesis – Trailer
Análises
Shingeki no Bahamut: Genesis
Uma série de curta duração que, na ausência de um enredo sólido de base, trabalhou arduamente as suas personagens principais e, essencialmente dessa forma, foi capaz de aguentar ao longo de toda a trama a irreverência e originalidade com que se destacou pela positiva logo nos primeiros episódios.
Os Pros
- As personagens
- Ambientes diversos fantásticos
- Coligação entre os vários tipos de criaturas
- A arte
- A animação
Os Contras
- Nada de relevante a apontar