No ano de 2006, o estúdio Nippon Animation adaptou para o pequeno ecrã o manga de Tomoko Hayakawa, Yamato Nadeshiko Shichihenge. Uma obra peculiar, repleta de ingredientes únicos que conferiam uma singularidade irreverente para a época em questão, contudo a dúvida permanece: terão sido as suas caraterísticas peculiares um chamariz para o público?
História
Quatro belos jovens vivem uma vida tranquila, longe dos holofotes e perseguições de fãs apaixonadas pela sua beleza paranormal, numa bela mansão. A vida dos quatro amigos nunca esteve tão perfeita não fosse a perturbadora façanha imposta pela dona da casa: os rapazes têm que transformar a sua sobrinha Sunako, numa verdadeira donzela. As expetativas de uma vida simples foram destruídas aquando a descoberta da jovem, “doce Sunako” é na realidade uma assombrosa menina, cujos interesses fogem em grande escala aos pretendidos para uma senhora.
Desde os primeiros episódios que a mensagem é clara: trata-se de uma comédia em torno de uma personagem feminina caricata que foge em quase todos os quesitos, ao estereótipo definido como “mulher ideal”.
O formato narrativo é relativamente simples, na maioria das vezes episódico, sendo a linha principal notória: transformar Sunako numa senhora. A mesma serve de motor para as demais temáticas, prodigiosamente mascaradas por elementos ludibriosos e condutas narrativo-visuais fantasiosas.
A complexidade de Yamato Nadeshiko Shichihenge
É verdade que esta obra apresenta-se sob a forma de uma premissa simples: uma rapariga com problemas sociais, desleixada e sem caraterísticas físicas apelativas, rodeada por quatro jovens que pecam pela sua aparência exuberante. Princípios que nos remontam, sem sombra de dúvida, para uma obra do género harem bishounen, certo? Errado!
Quem espera ver conquistas de amor e disputas infindáveis pela afinal bela e cheia de virtudes donzela, estão redondamente equivocados. Yamato Nadeshiko Shichihenge não se trata de um romance comum, atrevo-me a dizer que de romance tem muito pouco, e o pouco que tem foge certamente ao habitualmente descrito em produções do género.
Toda a obra trata-se de uma sátira à sociedade e aos valores pela qual é regida. Kyouhei e Sunako são usados como duas pontas opostas do mesmo problema; unindo os dois extremos, uma mulher “feia e assustadora” e um homem demasiado “bonito e perfeito”, é desenvolvido um conteúdo repleto de grandes problemáticas sobretudo direcionadas à valorização da aparência e todos os seus contornos.
O recurso às hipérboles é uma constante, no entanto não devem ser encarada de forma leviana, uma vez que todo o excesso não é mais que um embuste e fator de entretenimento para desviar a atenção dos mais distraídos. Contudo, tudo o que é demais é exagero sendo que a narrativa salta entre genialidade e aversão nesse quesito, tornando a obra um tanto ou quanto pitoresca. Afinal passamos de cenas pesadas a envolver temáticas como aceitação pessoal, expetativas dentro do seio familiar, bullying, auto-confiança, respeito mútuo, e todas as consequências que as mesmas provocam aos envolvidos, para discussões disparatadas a aclamar o registo mais cómico da franquia.
Ambiente
O ambiente é essencial para atenuar a linha narrativa por si só bastante complexa, ou não teríamos nós uma comédia romântica a servir-se de alguns dos mais problemáticos temas psicológicos e sociais como cerne narrativo. O ambiente repleto de explosões, frames alusivos e cenas em diferentes planos, desde as mais simplistas ao formato mais “chibi”, desvia a atenção até do espetador mais atento. A animação bastante diversificada preenche a produção de fantasia e exageros, que infelizmente não passam disso mesmo: exageros. A vontade de enfatizar a falta de confiança, traumas psicológicos e toda a psicose de Sunako através da injeção de elementos figurativos provoca exaustão visual e sucessivas quebras narrativas.
Por outro lado, é usada com especial requinte aquando o contraste entre Sunako e os outros seres humanos. Assim sendo, o ambiente oferece-nos os “olhos de Sunako”, permitindo-nos ver o que a mesma vê: criaturas repletas de brilho, criaturas normais, sem grande brilho e ela, um ser pequeno, asqueroso, insignificante.
Apesar da estranheza sentida quanto à aparência da protagonista (restringindo-se a traços simples, sem face ou expressões faciais mais desenvolvidas), esta é um importante marco na descrição e desenvolvimento da mesma, ajudando o espetador a discernir os momentos de maior significância, bem como a dar destaque à verdadeira aparência da protagonista, reafirmando a ideia que só é bela para quem realmente a quer ver.
A banda sonora é pouco significativa, sendo restrita a algumas músicas pop ou sons base, comummente utilizados para reforçar momentos de maior tensão. O destaque vai para os gritos e barulhos horripilantes dignos de filmes de terror, usados com frequência para retratar quer a Sunako como o ambiente em que coabita.
Juízo Final
A história simples, as personagens francamente estereotipadas e as linhas narrativas lineares assumem-se como um mau presságio para mentes sagazes e exigentes, afugentando os mais capazes para realmente apreciar a obra por trás da máscara. A franquia assume-se como uma espada de dois gumes, demonstrando também ela, a podridão e descrença humana. Uma produção repleta de brilho, de exageros visuais e piadas fáceis, é inclusive criticada pelos próprios personagens, assumindo eles mesmos o papel de espetador da sua própria tela.
Coberta por um ambiente fantasioso a roçar o exagero, contemplamos um verdadeiro frenesim de contrastes. Em suma, a maioria das situações são na realidade, analogias a situações quotidianas no universo de muitos jovens. A infelicidade é resultado de uma constante tortura psicológica retratada de forma divertida, quase passada para segundo plano por entre a comédia e backgrounds hilariantes, em tons de caricatura.
Francamente pouco atrativa em termos visuais, cativa inicialmente pela comédia simples de gargalhadas fáceis, num cenário estranho mas sem dúvida divertido. Sendo uma obra ideal para quem pretende assistir a algo simples sem querer comprometer-se por linhas mais complexas. No entanto, à medida que a história se desenvolve a carga emotiva e consequentemente dramática intensifica-se, sem contudo transpor níveis demasiado fortes.
Pessoalmente, acredito que seja uma obra a constar nos vossos reportórios, utilizando a genialidade e divertimento como chamariz às mentes audazes e capazes de compreender e acompanhar este patinho feio a tornar-se um verdadeiros cisne.
Análises
Yamato Nadeshiko Shichihenge
Em 2006 estreia Yamato Nadeshiko Shichihenge, uma obra peculiar, repleta de ingredientes únicos.
Os Pros
- Enredo;
- Personagens - genialidade na utilização de estereótipos.
Os Contras
- Ambiente;
- Banda Sonora vai do exagero à nulidade.