O filme de Yukihiko Tsutsumi tem uma premissa aparentemente simples: 12 adolescentes aceitam o convite de participar numa assembleia de suicídio coletivo. No entanto, as pessoas que vejam 12nin no Shinitai Kodomotachi (12nin) – ou então, tristemente traduzido para 12 Suicidal Teens, em inglês, com a ideia de que é um simples mistério sobre um assassinato ou mesmo um rip off do Battle Royale – hão-de perceber de que não é essa a verdadeira mensagem do filme.
Claro, há um mistério a ser resolvido – saber a quem pertence o corpo de um rapaz que apareceu no local muito antes de a assembleia ter início. Contudo, 12 Suicidal Teens gira em torno de um grupo de pessoas que se reúnem com o mesmo objetivo final: a morte. Doze adolescentes que se inscreveram online para fazer parte de um suicídio coletivo. Apesar de as suas razões individuais serem bastante diferentes, a narrativa que os junta flui bem e as peças do puzzle são colocadas de modo a trancar os números da lista. Portanto, as suas histórias individuais enchem alguns pontos vazios da narrativa principal.
12 Suicidal Teens, lançado em 2019, é uma adaptação de um romance de Tow Ubukata, que também escreveu Mardock Scramble, Le Chevalier D’Eon e Heroic Age.
Trailer
Doze adolescentes, de diferentes origens e backgrounds opostos reuniram-se num hospital abandonado com o propósito de se eutanasiarem juntos. À medida que chegam, um a um, ao armazém onde estão preparadas as camas para poderem executar o procedimento, descobrem que uma 13ª pessoa já está dentro da divisão, presumivelmente tendo morrido antes deles. A fim de confirmar a sua determinação de morrer, bem como para descobrir como é que esta se juntou a eles, o organizador da assembleia pede aos participantes para conversarem uns com os outros antes de prosseguir.
12 Suicidal Teens surge num país onde, nos últimos anos, regista a maior taxa de suicídios juvenis nos últimos 30 anos. Só em 2017, 250 crianças em idade escolar tiraram as suas próprias vidas. Ijime (bullying) é um dos maiores fatores, todavia há outras razões que incluem problemas familiares e dúvidas sobre o futuro. No entanto, mais de metade dessas mortes – 140 – têm causas desconhecidas, uma vez que os estudantes não deixam rastos informativos para trás.
Num espectro maior, de acordo com a BBC, em 2014, mais de 25 mil pessoas cometeram suicídio, dando uma média de 70 mortes por dia. Porém, a maior taxa de suicídio entre países desenvolvidos existia, naquela altura, na Coreia do Sul, com uma média anual de 28,9 suicídios por 100 mil habitantes. Na nação nipónica, em 2016, foram registadas, segundo relatórios oficiais, 21,8 mil mortes, o menor número em mais de duas décadas.
Embora tenha diminuído nos últimos anos, a taxa de suicídio no Japão ainda é alarmantemente alta em comparação a outros países – não ajuda muito ter um governo que não se preocupa com este problema. Entre os jovens, o índice continua alto, como apontam os dados. O maior número de suicídios ocorre entre adolescentes do ensino básico.
No Japão, a ideia de suicídio carrega um background histórico-social de grande influência: envolveu abordagens honoríficas para o ato, como o cometer seppuku e evitar a desonra devido a fracasso de batalhas – para os guerreiros samurais, não havia nada mais importante na sua vida do que a honra; ou então os jovens pilotos “kamikazes” de 1945, recrutados de universidades, que pilotavam aviões carregados de explosivos para realizar ataques suicidas, instigados por uma ideologia do culto à morte, propagandeada pelo Estado. Aliás, a palavra kamikaze passou a ser usada em diferentes línguas como uma metáfora para pessoas, ações ou práticas potencialmente suicidas, inclusive em sentido figurado.
O Japão também não é um país cristão e o suicídio não é visto como sendo um pecado, mas sim como uma forma de assumir responsabilidades por alguma coisa e não fugir a elas.
A chegada da pandemia trouxe em outubro do ano passado, numa notícia avançada pelo Diário de Notícias, um número superior de suicídios no Japão do que as mortes por Covid-19. Segundo os dados oficiais do governo, foram registados 2153 suicídios no mês passado, sendo que o número de mortes por causa do novo coronavírus tinha chegado aos 2087. Dentro destes dados preliminares, o maior aumento é entre jovens com menos de 29 anos – o suicídio continua a ser a principal causa de morte no Japão para as pessoas com idades entre os 15 e os 34 anos.
12 Suicidal Teens, portanto, é um reflexo de uma sociedade que carrega este problema intemporal. É oportuno, se não do tipo de filmes bem-intencionados que os realizadores japoneses tendem a fazer para levantar o véu sobre certas questões sociais. Na verdade, o filme ganha mais se for visto como um drama social do que um thriller sobre um crime.
O filme tem semelhanças passageiras com Suicide Club, o sucesso de culto de Sion Sono, de 2001, que fez dos suicídios em massa uma forma de entretenimento sombriamente elegante. Fica prometido uma análise a esse filme no futuro.
Em vez de planearem serem colhidos numa plataforma de metro, como as 54 estudantes de Sono, os adolescentes de Tsutsumi são examinados via online por um membro do seu grupo – Satoshi (Mahiro Takasugi) – que seleciona 11 para o que o seu website chama de uma “morte indolor.” Um a um, eles dirigem-se para um hospital abandonado onde, depois de seguir um elaborado procedimento de segurança, dirigem-se, num encontro ao estilo de 12 Angry Men, para um grande quarto com 12 camas. Ao meio-dia, o anfitrião da assembleia faz a sua entrada e dá início à sessão – mas numa das camas já está lá alguém, possivelmente morto.
Enquanto que a dicotomia morte/vida é central na narrativa do filme, o corpo anónimo traz outra dicotomia: a de homicídio/suicídio – tirar a vida de alguém ao invés de tirar a sua própria vida.
É esta oposição que faz desenrolar a história: existe alguém inanimado numa cama. Ora, se ele foi assassinado, os 12 adolescentes apercebem-se de que um deles, ou mais do que um, é o responsável. A unidade de grupo começa a desmoronar-se. Se eles quiserem proceder com a eutanásia, só o podem fazer depois de desmascarar o assassino.
É interessante saber que este conflito nasce de uma regra fundamental do grupo: enquanto não houver um consenso completo entre os adolescentes, unanimidade total, enquanto uma pessoa votar contra o suicídio, o grupo não pode continuar com o procedimento.
É esta necessidade de haver um consenso – e isto é importante – que surge espaço para a comunicação, para o discurso. Estes adolescentes compartilham um desejo de morrer, um desejo de desfazer o seu nascimento, e o “falar sobre isso” permite-lhes compartilhar as suas próprias lesões e ouvir os ferimentos psicológicos aos quais os outros foram submetidos.
12 Suicidal Teens mostra que, compartilhando feridas, falando sobre o que lhes perturba mentalmente, é uma forma de união.
Por trás do desejo de suicídio dos jovens, por trás da variedade de lesões psicológicas que eles expressam, reside outro problema crucial, talvez toda a sua fundação do tecido psicológico rasgado que os protagonistas carregam: a inadequação do seu ambiente social (amigos, família, escola, …), o próprio facto de que, no seu contexto social, ninguém estava lá para levá-los a sério.
Enquanto que tentam resolver o crime, os protagonistas unem-se, chocam-se e revelam as razões pelas quais procuram a morte. O tumultuoso Kenichi (Yuto Fuchino) sofreu bullying constante por ser socialmente ignorante. A “goth lolita” Mitsue (Kotone Furukawa) quer seguir um músico favorito para o além; e o doente terminal Shinjiro (Mackenyu Arata) quer morrer antes que seja tarde demais.
Alguma das narrativas individuais são mais difíceis de perceber, mas elas são expostas, não perdendo muito tempo a sentimentalizar os seus passados. Não há flashbacks toscos, nem momentos de puxar a lágrima, se bem que há backgrounds bastante relevantes a nível social que foram totalmente ignorados. Há também sequências analépticas filmadas num tom mais sépia, e que aparecem a conta-gotas ao longo do filme, não contribuindo para a narrativa. Algumas personagens (a moça emo-lolita, o delinquente, etc. …) são caracterizadas por aspetos caricaturais, o que revela o uso de personagens-coletivas bem conhecidas, mas que também torna essas personagens distinguíveis.
Em termos de realização, Tsutsumi compôs 12 Suicidal Teens de uma forma dinâmica, usando muito o espaço cinematográfico. Este dinamismo é bastante agradável – o movimento cinematográfico é feito de uma forma lenta e algo persistente.
Estas estratégias, juntamente com a trilha sonora tentam criar uma atmosfera tensa, que é suportada pela visualização do espaço narrativo e dão-nos a sensação de o que se passa com os adolescentes, é, no fundo, muito maior do que eles. A representação, apesar de ser bastante decente, não é suficiente – mas isto também é culpa do estilo de realização – se não se filma momentos de tensão, e também com a tensão certa, não há oportunidade para os atores brilharem, até porque no elenco temos nomes como Takumi Kitamura, Mackenyu Arata e Hana Sugisaki, elenco este que foi bastante mediatizado.
Enquanto 12 Suicidal Teens é uma narrativa de mistério tolerável, infelizmente não consegue passar a sua mensagem de uma forma suficientemente poderosa. Acaba por ser uma experiência esquecível. No entanto, o filme serve com o propósito de estudar e refletir sobre o tema – a vida, como algo que nos é roubado, só a queremos de volta.
Se precisarem de ajuda têm disponíveis as linhas SOS Voz Amiga e outras associações, bem como a linha SNS24 ou o 112.
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Análises
12 Suicidal Teens
Doze adolescentes inscrevem-se para serem participantes de uma assembleia para cometer suicídio coletivo. Porém, eles descobrem que outra pessoa estava dentro do quarto onde planeavam executar o processo de eutanásia, aparentemente sem vida.
Os Pros
- Apresenta uma causa social
- A realização não magoa
- Elenco é decente
- Algumas personagens bem interessantes
Os Contras
- Elenco mal aproveitado - estratégia de marketing excelente para nada
- Narrativa algo irrealista
- Demasiadas personagens caricaturadas
- A mensagem não é transmitida, ou então é transmitida uma ideia de falsa felicidade
- Analepses desnecessárias
- Faz uso do espaço cinematográfico, mas não o deixa respirar
- Estilo de realização não cria tensão suficiente