Após dormir sobre o assunto assumi o desafio de escrever esta espécie de análise ao reboot da franquia Digimon Adventure. Lançado em 2020 para celebrar os 20 anos da franquia, este reboot deu a entender que iria recontar a história adaptada aos dias de hoje. Como fã de Digimon Adventure estava curiosa com a proposta e bastante expectante com o que iriam fazer…
Mas eis que vejo os primeiros episódios e o meu cérebro bugou.
Análise Digimon Adventure 2020

Síndrome do protagonista
Melhor, continuo a assistir e o meu cérebro continua a bugar cada vez mais, incapaz – coitado! – de compreender porque raio aparece logo um Omegamon tirado do c* nos primeiros episódios e porque é que o Tai tem destaque em TUDO.
Esperem, o meu cérebro estava tão mal que, imaginem vocês, achou que iriam fazer uma intro especial para cada criança tal como aquela era dedicada ao Taichi =’)
Não há palavras para descrever a minha frustração inicial. Claro que adorei a animação polida e com grandes coreografias de batalha. Não me interpretem mal, houve coisas boas, mas não me digam que foi uma boa abordagem pegar num protagonista principal e juntar “ajudantes”.
A situação chega ao cúmulo em que há uma parte da história em que cada criança escolhida tem um episódio dedicado à mesma para digivolução do seu digimon (e mais não vou dizer para não spoilar) e o Taichi aparece em TODOS. Sim, estão a ler bem.
Imaginem a situação: crianças escolhidas separam-se para evoluirem os seus parceiros digitais… e o Taichi vai visitá-las uma a uma. Mas tipo a surgir do nada porque sim. Quando damos por ela estamos a ver o episódio e a pensar: pronto, vai ser agora que o Taichi vai aparecer!
O Taichi sempre teve destaque na franquia, isso não está aqui em questão. Mas uma coisa é um líder dentro de um grupo de crianças escolhidas, outra é tudo girar em torno dele ao ponto que as restantes crianças escolhidas perdem a “personalidade” que tanto as caracteriza. Se tudo gira em torno de um protagonista é natural que o desenvolvimento de cada uma das outras personagens seja negligenciado.
Digimon Adventure vs Digimon Adventure 2020
É impossível não comparar ambas as versões da franquia. Primeiro, o reboot 2020 foi inspirado na obra original Digimon Adventure: mesmas personagens principais e uns fundamentos base mantiveram-se. Segundo, ao existir tanto universo dentro da franquia Digimon é inevitável comparar algo que pega nos “inícios” da franquia e tenta reescrevê-la. Compará-las é um ótimo ponto de partida para perceber porque uma é icónica e marcou uma geração; e a outra suspeito que seja tão esquecível quanto polémica.
Apesar de fã tenho uma memória falível, inclusive já vi os filmes Adventure há anos (quiçá uma década) e nem vi todas as séries Digimon que seguiram o 02. Posto isto, também não vou comparar com os filmes Tri, vou-me focar no que para mim, criança da geração de 90, gostei e me foi impactante. Claro que depois ainda revi duas vezes Digimon Adventure pelo que poderei ainda usar o comparativo enquanto adulta.
O início do Digimon Adventure 2020 deixou muita gente hypada. Afinal começamos logo com grandes batalhas, vilões que fazem sentido dentro do tema “mundo digital” e ainda uma associação de se tirar o chapéu de “causa-efeito” entre mundo digital e mundo humano.
Se tiver em conta que o anime se destina a um público infantil, não posso negar que foi uma introdução inteligente e capaz de agarrar gerações muito pouco habituadas a saborear as aventuras do “world building“.
No entanto, não menosprezemos a capacidade dessa mesma geração de compreender o que é um bom anime. Digimon Adventure 2020 peca por ser “mais um” anime para crianças, sem nada a adicionar, sem nada a sentir. Apenas um fogo de artifício de animação e de monstros digitais.
Como é que os guionistas com um material fonte tão bom em torno do significado dos emblemas de cada criança não o usa? Mais, conseguimos perceber que estão confusos entre criar um episódio interessante e usar “algo” que pegue nesse mesmo significado sem nunca o referir.
Ou seja, se o Yamato, por exemplo, possui o emblema da “Amizade” naturalmente que o episódio em que ele digivolui o seu digimon deveria ser focado nesse tema. O problema é que por vezes isso acontece e outras vezes não. Mais, eu sei o significado dos emblemas porque vi o Digimon Adventure mas as gerações que apenas assistam a este reboot não saberão nem a sua importância nem o que significa cada um deles.
A série dá a entender que não sabe bem o que quer ser, para onde quer encaminhar a história, o que se repercute também nos vilões. Revemos alguns deles (Devimon sempre presente xD) e a dinâmica continua boa, todavia fico confusa com a escala de poderes… Temos vários “final boss” ao longo dos 67 episódios, mas em vez de serem nível crescente de poder a escala é um pouco confusa. (Como chegam ao nível sagrado para depois esse vilão não ser “O Vilão” e ainda existir outro que consegue ser destruído sem chegar ao nível que se chegou?????)
É também confusa a forma como mexem com a digivoluções, os poderes, a questão dos Holy digimon e da guerra do passado. São tantos conceitos que ao não serem explicados fico apenas frustrada por ver “cenas fixes” e não as ver desenvolvidas como gostaria. Em suma, achei a série um desperdicío de potencial de todo o tamanho.
Mas claro que nem tudo foi mau…
Até que houve coisas boas…
O reboot de Digimon Adventure teve momentos interessantes e que – quase – nos agarraram. Havia potencial: adicionaram digivoluções diferentes, variações interessantes (mesmo que sem razão aparente salvo coolness ou conveniência narrativa) e, o que mais gostei, pegaram em personagens muito queridas pelo público como Leomon e Ogremon.
Rever quem gostamos sempre é bom. Palmas para aquilo que fizeram com o Ogremon tanto no primeiro como no segundo cour. Acabou por se destacar, inclusive, face ao Leomon.
Peguemos no caso da Tailmon, sem querer spoilar, a construção para chegarmos ao encontro entre Tailmon e Hikari foi muito bem escrito. Genuinamente que fui surpreendida, e isso é algo a se destacar!
Outro ponto que até não desgostei foi o facto de ser um anime, sobretudo, episódico e de fácil compreensão. Contudo, só ganharia se adicionassem um pouco mais de sumo. Em boa verdade, dada a falta de desenvolvimento das crianças escolhidas até que ficaria bem usar algo mais que a “Luz, Esperança e Coragem”.
Juízo Final
Se me perguntarem se recomendo Digimon Adventure 2020 a resposta é não. Não há nada nele que seja bom o suficiente para dispenderem o vosso tempo a assisti-lo em prol de outro bom anime.
Não adiciona nada e não substituiu – nem de longe – a primeira série da franquia. É um projeto que se aproveitou da nostalgia e do conceito criado pelo Digimon Adventure para desenvolver um conjunto de episódios capaz de agradar às massas sem se comprometer com profundidade ou qualidade narrativa.
Para mim, mesmo o público-alvo sendo crianças penso que não é desculpa para o desleixo narrativo que senti. Também elas merecem assistir a algo consistente, profundo sem ser dramático, e repleto de batalhas e evoluções com uma lógica.
Por outro lado:
- se fores mega fã da franquia;
- gostas do mundo digital e das suas personagens;
- queres ver algo sem comprometimento e com bónus de ser algo familiar.
Ok, cumprindo estas 3 condições, vê. Vais gostar!
Pessoalmente, não vou dizer que não me diverti ao longo destes 67 episódios, mas admito que me enquadrei muitas vezes nas condições acima. Tem boa animação, bom voice acting, boa banda sonora, tem qualidade técnica garantida! Não é um esforço assistir, apenas há tanta coisa melhor para ver….
Análises
Digimon Adventure 2020
As crianças escolhidas estão de volta mas num universo digital um pouco diferente. Com o mundo humano em perigo e o seu regresso a casa em cheque, as crianças juntam-se aos seus digimons numa jornada no mundo digital.
Os Pros
- Nostalgia
- Alguns digimons muito interessantes
- Animação das batalhas
Os Contras
- Falta de personalidade/desenvolvimento das personagens
- Não desenvolvem os emblemas
- Tudo gira em torno do Taichi