Nota: Neste primeiro artigo sobre Kuzu no Honkai abordarei algumas das temáticas que achei mais relevantes até ao episódio quatro. Contudo, este texto, foi feito com o intuito de motivar quem não o está a assistir, a começar a fazê-lo e abrir espaço para debates entre os que já são espectadores. Sendo assim, aqui não encontrarão qualquer spoiler. Mas a partir da próxima semana analisarei especificamente as cenas de cada episódio.
Kuzu no Honkai – Reflexão dos primeiros 4 episódios
Que os Slice of Life de hoje em dia são praticamente todos mais do mesmo, não é novidade. Aliás, nem mesmo eu que sempre adorei ver animes de vida quotidiana tenho paciência para assistir à maioria das obras atuais do género. Todos nós temos noção que a indústria dos animes está a atravessar uma crise e que nos cinquenta títulos que saem por temporada só se aproveitam meia dúzia – às vezes nem isso.
Porém como sou uma fã de animes onde não existem super-poderes e pessoas que voam, acabo sempre por dar uma vista de olhos nas premissas antes das suas respetivas estreias. Kuzu no Honkai chamou-me à atenção desde cedo, não pela sinopse em si, mas pelo que comentavam sobre o manga.
Primeiramente toda a gente referia o facto de a obra tratar o sexo como uma coisa normal e necessária a todas as relações. Este pormenor chegou para me convencer. O único Slice of Life onde vi abordarem essa temática foi Nana – que é inclusive dos animes que eu mais adoro. Também li em alguns fóruns que as personagens eram todas umas filhas da mãe.
Quatro episódios depois estou aqui para partilhar o que penso de Kuzu no Honkai e todas as questões que este levanta. Podemos inclusive começar pelo título. Em terras ocidentais, este ficou conhecido como “Scum’s Wish”, o que, tentando traduzir de forma leviana significa o desejo da escória. Escória basicamente é a parte mais desprezível da sociedade, pessoas más e repugnantes. Tendo em conta o que já tinha lido sobre o manga, o título faz imenso sentido.
Porém, o que é exatamente Kuzu no Honkai? Segundo o MyAnimeList, é um anime de vida escolar com romance e drama, e enquadra-se na categoria Seinen. Sem querer ir contra os especialistas – ou não – que classificam os animes, este aqui não é uma obra de romance. Ou pelo menos, não é uma obra de romance convencional.
Kuzu conta-nos a história de dois adolescentes, Hanabi e Mugi. Ambos gostam de pessoas mais velhas que não os vêem da mesma maneira. Então, na tentativa de se consolarem, decidem começar a namorar um com o outro e passar o tempo a fazer sexo. No entanto isto é só a tampa do poço.
Num primeiro contacto com a série podemos entender que tanto um como outro não são necessariamente más pessoas. São jovens que têm os seus sentimentos reprimidos e que procuram apaziguar a dor de alguma maneira, mesmo estando cientes que só estão a mentir a si próprios.
É aqui que principia aquele que é o ponto forte de Kuzu no Honkai e o flagelo de 90% dos animes atuais: as personagens são estupidamente humanas. O anime retrata plenamente sentimentos como a solidão, o ódio e a inveja. E sobretudo, o quanto o ser humano é corrompido e fútil.
Claro que o facto de eu ter uma visão negra sobre o homem faz com que eu olhe para Kuzu no Honkai como uma obra mais realista. Ninguém é totalmente bom ou totalmente mau, ninguém está livre de sentimentos nojentos, ninguém é intocável e ninguém tem uma vida perfeita.
O que existem são máscaras. Nestas, as pessoas escondem-se e encaram personagens. Fingem que são puras, que não têm malícia dentro de si e que o mundo é que é podre. Os protagonistas deste anime representam isto de forma soberba. Por isso é que são todos filhos da mãe e que é difícil apegarmo-nos a alguém dentro deste universo.
Realmente, não gosto de ninguém deste anime. Sinto empatia por alguns em determinados momentos. Contudo identifico-me demais com algumas atitudes que elas têm e só por esse motivo, não dá para questionar a qualidade das mesmas.
É por isto que Kuzu no Honkai não é um anime de romance. O drama não é puro, as relações são porcas – no sentido mais asqueroso do termo – e as pessoas são uma merda. Usam-se, passam por cima umas das outras, manipulam-se e humilham-se. E mesmo que haja uma ou outra ligeiramente mais bondosa, todas elas em algum momento vão seguir o rebanho.
É incrível a maneira como usam o sexo, por exemplo. Como aqui os personagens são humanos, o sexo é uma coisa intrínseca na narrativa. E é sempre explícito o que acontece. Não pelas cenas visuais, mas pelos diálogos e pelo timing do guião. Então não, não pensem que este anime é um ecchi. As cenas eróticas não tentam ser sensuais, tentam ser dramáticas e ao mesmo tempo explorar as situações dos personagens.
Kuzu no Honkai, até ao momento, está muito próximo daquilo que eu chamaria uma obra de arte. O enredo é diferente, as personagens fogem de todos os clichés e a direção é absolutamente fantástica. Para quem gostar de romances leves e divertidos, realmente não recomendo. Mas para aqueles que quiserem ver um bom anime com uma narrativa sólida, ainda vão a tempo de embarcar na jornada. Cá estarei na próxima semana para debatermos mais alguns pontos.