Encontrar uma solução para o problema demográfico do Japão tem sido uma das prioridades do governo japonês. Desde 2016 que a população do país começou, oficialmente, a decrescer, segundo os dados dos censos realizados pelo próprio governo. A população japonesa é já a mais envelhecida do mundo, com a maior percentagem de pessoas acima dos 65 anos.
Não se trata apenas de um problema social, já que acaba por ter repercussões profundas para a economia, levando o ex-primeiro-ministro japonês Shinzo Abe a classificar o problema como uma “crise nacional”. Crise nacional ou não, as implicações são óbvias. As previsões de crescimento do FMI para o Japão colocam o país consideravelmente abaixo da média mundial e as Nações Unidas têm colaborado com os sucessivos governos do Japão, de forma a desenvolver uma resposta.
Namoro Online – a resposta à crise?
Pode parecer insólito, mas esta é, de facto, uma das vias que o governo japonês procura utilizar no combate à reduzida natalidade do país e ao número decrescente de casamentos. No início deste ano, o governo japonês anunciou que iria começar por investir mais de 16 milhões de euros em projetos de Inteligência Artificial, que possam ser usados em sites de encontros online.
Este tipo de plataformas online já beneficiavam de alguma popularidade no Japão, resultante da facilidade e privacidade em encontrar parceiros compatíveis. À semelhança do resto do mundo, estes sites tiveram no Japão um rápido crescimento durante a pandemia. Em contraste, os casamentos, no mesmo período, sofreram uma queda ainda mais acentuada, numa cultura em que a esmagadora maioria de recém-nascidos são de pais casados. Estas plataformas digitais de promoção de encontros online costumam ser geridas por humanos, mas o Japão procura apostar em tecnologia de AI para aumentar a eficiência de emparelhamento entre jovens sérios na sua procura por companheiros de relações a longo prazo.
Burakku Kigyo – as empresas maléficas
Mas, o que está, afinal, por detrás da crise social do Japão? Enquanto alguns indicam questões culturais e sociais, como o aumento das mulheres no mercado de trabalho, que acabam, por sua vez, por dar menos prioridade a questões de casamento e filhos, outros apontam o dedo para a instabilidade laboral vivida por muitos jovens no Japão.
Embora seja um país conhecido pelo seu sucesso económico, a verdade é que a percentagem de emprego classificado como “instável” aumentou consideravelmente nos últimos anos, especialmente nas faixas etárias mais jovens. Para além de algumas dificuldades económicas do país terem sido temporariamente camufladas pelo declínio da população, algumas revisões da lei laboral do Japão nas últimas décadas permitiram o aumento de contratações temporárias ou contratações feitas através de empresas intermediárias. Não é por acaso que os japoneses sublinham que as aplicações de encontros online acabam por ser uma alternativa mais barata.
Algumas empresas utilizam esta incerteza laboral sentida pelos trabalhadores para exigir mais horas de trabalho extra, com pouca ou nenhuma remuneração. Esta cultura de trabalho excessivo tem resultado inclusive em mortes por exaustão, conhecidas pelo termo karoshi.
Estas práticas laborais serviram de inspiração para o prémio anual Burraku Kigyo, premiado à empresa escolhida pelo júri como tendo o pior tratamento para com seus trabalhadores. O termo que se refere a “empresas negras” foi utilizado no título do livro publicado em 2012 por Haruki Konno.
Esperança pós-crise
Em 2011 o Japão sofreu um dos seus maiores desastres. Um terramoto de magnitude 9.1 atingiu a costa da ilha, seguido de um tsunami devastador, resultando na morte de mais de 18 mil pessoas e na destruição de centenas de milhares de casas. O povo japonês rapidamente deu início ao processo de recuperação e reconstrução. Não obstante o sofrimento nacional, o período que sucedeu verificou uma subida do número de casamentos.
Similarmente, inquéritos mostram que devido à recente crise pandémica o número de jovens japoneses que pondera casar aumentou em relação a anos anteriores. Pode ser que a aposta do governo japonês nas alternativas digitais consiga aproveitar esta oportunidade.