Desde o lançamento da primeira parte do anime que esta questão me assombra. Foi preciso ter deixado a “poeira assentar” para conseguir sair uma linha de raciocínio minimamente coerente. Após ler alguns artigos e ter comentado com alguns amigos sobre assunto eis que me sinto preparada para escrever sobre.
Deixo já aqui o disclaimer que este artigo trata-se da minha opinião com as limitações do que já vi e conheço de animação e do género gag.
Gokushufudou Anime – Foi ou não foi uma Desilusão?
Também conhecido como The Way of the House Husband, Gokushufudou (anime, neste caso) trata-se da adaptação de um manga seriado pela Kurage Bunch, do autor Kousuke Oono.
Se não me engano foi o Roberto que me a recomendou e, desde logo, fiquei rendida pelo humor peculiar que esta obra transmitia.
The Way of the House Husband – Sinopse
Gokushufudou acompanha o dia-a-dia de Tatsu, um ex-yakuza que abandona o seu emprego enquanto “yakuza profissional” – o qual exercícia com exímio gabarito (tendo, inclusive, a alcunha de “Immortal Dragon”/Tatsu O Imortal), – após se casar.
Como qualquer típica família japonesa, um dos elementos do casal trabalha para pagar as contas da casa enquanto que o outro gere as lidas domésticas e todo o orçamento famíliar. Esse papel que normalmente recai sobre a mulher, no caso do casal Tatsu e Miku, é o homem que assume – com distinção – esta nova profissão.
E não podia desempenhá-la de melhor forma…
A falta de senso comum do Tatsu aliada aos “struggles” habituais de arrumar e tratar da casa tornam um simples fatiar do pão uma tarefa digna de um projeto!
Perdi-me no número de vezes que dei por mim a gargalhar alto enquanto lia mais um capítulo das aventuras do meu ex-yakuza preferido e dos seus comparsas – alguns ainda a exercer a profissão. Que melhor forma há para dignificar as tarefas domésticas do que vê-las a serem executadas e explicadas por um badass ex-yakuza?
Em termos de história, esta obra é incrível! Consegue criar os momentos mais inusitados, explorar personagens ao ponto em que se torna quase impossível prever o que vem a seguir. Para além disso o feeling é super leve e divertido. Não é uma história maçadora e a linha narrativa trata-se apenas do acompanhar do dia-a-dia do ex-yakusa.
Na minha opinião, dos melhores gag manga da atualidade. Um slice of life de comédia, uma paródia dos tempos modernos, um romper de paradigmas e um alerta para que as aparências enganam.
Então, se o material fonte é ótimo, o que pode falhar na adaptação anime?
Gokushufudou – Um anime que dividiu opiniões
A animação escolhida foi, de longe, consensual. Uma aposta arriscada numa das adaptações mais aguardadas de 2021 e, não vou mentir, num primeiro impacto, o anime desiludiu-me. Estava à espera de animação 2D tradicional, algo que animasse todas aquelas cenas que eu li e que adoraria ver com todo o movimento e fluidez que a animação japonesa tão bem me habituou.
Obviamente que o género não me era estranho, já tinha visto algo semelhante nas curtas experimentais japonesas (Anime Mirai ou Japan Animator Expo) ou em obras como Inferno Cop. Mas lá está, foram tudo obras de culto, de nicho e longe do espectro de popularidade de Gokushufudou. No Japão, chamam a este tipo de animação de “motion manga” ou “vomic” (voiced comic – comic com voz) e é, como o nome indica, manga com voz e algum movimento. Como se estivéssemos a ler o manga com as vozes segundo “enquadramento”/ângulos que o autor queria que vissemos as cenas.
Foi uma aposta arriscada e, no início, nem percebi bem o porquê desta escolha. Pouco tempo depois de começar a assistir descobri a justificação em artigos que explicavam que foi uma exigência do autor.
Tratando-se de um género gag manga a dificuldade em transformar em anime é imensa. Afinal tratam-se de pequenos sketches de poucos painéis, que exploram situações da vida. Em anime a fluidez de história seria quase impossível de conseguir sem alterar algo no core narrativo.
Primeiro estranha-se e depois entranha-se…
Vamos ser sinceros, depois de começarmos a assistir, após os primeiros 5 episódios que compõe o primeiro cour, acabamos por gostar e já nem imaginar ver a série de outra forma. O verdadeiro caso da máxima “primeiro estranha-se e depois entranha-se“.
Para ajudar temos o melhor voice acting EVER. Enquanto leitora do manga imaginava a voz exatamente assim e sei que a maioria dos meus amigos que lêem a manga sentiram o mesmo quando ouviram a voz do Tatsu: É ISTO!!!! E penso que essa genialidade no casting só demonstra, uma vez mais, o cuidado que o estúdio e a equipa de produção teve para produzir esta série.
A J.C Staff não só respeitou a decisão do criador como tentou criar a melhor versão de “motion manga” possível com muita cor, cortes e enquandramentos espetaculares que só potenciaram o manga.
Em suma, vale MUITO a pena ver o anime e espero que arrisquem e saiam da zona de conforto. Custa, não vou mentir, para quem está habituada a um tipo de animação ver outro é estranho. Mas o estranho não é sinónimo de ser mau e acabamos por nos deliciar à medida que aprendemos a apreciar esta forma de arte.